A literatura é essencial ao homem, pois essa atividade estimula a criatividade

INTRODUÇÃO

A literatura possibilita o conhecimento dos educandos, tanto em relação à complexidade da sua realidade como também da sensibilidade que os textos literários oferecem, alcançado por meio do seu efeito estético. Isso ocorre porque a literatura é, em sua essência, uma manifestação artística, e, por isso, possibilita o confronto de diversos sentimentos. A literatura é parte fundamental para a construção da sensibilidade do conhecimento, pois, sendo arte, humaniza-nos.

Em relação à literatura infantil, o sentido é o mesmo, ou seja, é uma manifestação artística que ocorre por meio da palavra. A literatura feita para criança possui algumas diferenças em relação à literatura para adultos, sendo que essas diferenças decorrem das peculiaridades próprias dos seus leitores. Desse modo, quando se trata do leitor infantil, a história, o modo de ler e a linguagem devem atender às especificidades desse público.

A literatura infantil é imprescindível na realidade escolar. Ela trata, de modo peculiar, a nossa história, de maneira que possamos refletir e compreender as relações sociais e culturais ao longo do tempo. Isso evidencia que os estudantes necessitam vivenciar a literatura como elemento fundamental na compreensão histórica das relações humanas. É atribuída à escola a tarefa de apresentar esse mundo de conhecimentos aos estudantes, uma vez que, nem sempre, isso ocorre no núcleo familiar.

Nessa perspectiva, o objetivo deste estudo é analisar a forma como é abordada a literatura infantil em duas escolas públicas do ensino fundamental I da região oeste da Bahia, sendo uma da cidade de Barreiras, e outra de Wanderley. Participaram deste estudo duas professoras, sendo uma de cada escola. Utilizamos o diário de campo com base em observações realizadas nas aulas das professoras que participaram da pesquisa, e também um questionário que foi respondido por essas profissionais. Nosso interesse é conhecer qual a concepção de literatura, sobretudo, da infantil, que as professoras possuem, e verificar se as compreensões apresentadas refletem nas suas práticas em sala de aula. A partir dessas respostas, propomos uma reflexão sobre como a literatura infantil pode ser instrumento para a formação do leitor.

ALGUNS ASPECTOS SOBRE LITERATURA INFANTIL

Para pensar a definição de literatura infantil e suas características, é interessante que, primeiramente, seja realizada uma reflexão sobre o seu surgimento. Assim, é fundamental conhecer autores e obras. Zilberman e Lajolo (1999, p. 15) apontam quais são as primeiras obras que podem ser consideradas como literatura infantil:

As primeiras obras publicadas visando ao público infantil apareceram no mercado livreiro na primeira metade do século XVIII. Antes disto, apenas durante o classicismo francês, no século XVII, foram escritas histórias que vieram a ser englobadas como literatura também apropriada à infância: as Fábulas, de La Fontaine, editadas entre 1668 e 1694, As aventuras de Telêmaco, de Fénelon, lançadas postumamente, em 1717, e os Contos da Mamãe Gansa, cujo título original era Histórias ou narrativas do tempo passado com moralidades, que Charles Perrault publicou em 1697.

Nessa relação, o escritor francês Charles Perrault merece destaque, uma vez que foi um dos grandes responsáveis pelo surgimento da literatura infantil. Perrault escreveu tendo como base histórias populares, que ficaram conhecidas como contos de fada. Dentre suas histórias de sucesso, podemos mencionar os contos “Chapeuzinho vermelho”, “Cinderela ou A gata borralheira”, “O pequeno polegar” e “A bela adormecida”, amplamente conhecidas pelo público brasileiro.

Zilberman e Lajolo (1999) abordam que o desenvolvimento da literatura infantil não foi responsabilidade dos autores franceses, e que ele ocorre simultaneamente na Inglaterra, país que passava por um intenso processo de industrilização e urbanização. Esses acontecimentos interferiram diretamente nas concepções da sociedade, e, consequentemente, da literatura infantil. Dessa maneira, entender todo o processo de consolidação da literatura infantil passa também por uma compreensão do contexto da época. Zilberman e Lajolo (1999, p. 16) pontuam que:

A industrialização consistiu no fenômeno mais geral que assinalou o século XVIII. Foi qualificada de revolucionária e classificou o período, porque incidiu em atividades renovadoras dentro dos diferentes setores do quadro econômico, social, político e ideológico da época.

As mudanças ocorreram também nas escolas, uma vez que “ela passa a ser obrigatória para crianças de todos os segmentos da sociedade, e não apenas para as da burguesia” (ZILBERMAN e LAJOLO, 1999, p. 18). Conforme as autoras, essa modificação na distribuição do ensino para todos possibilitou a retirada de crianças do trabalho nas fábricas e estabeleceu a família como instituição social.

Esse novo panorama da sociedade provocou mudanças significativas no que diz respeito à visão que se tinha sobre a infância, ou seja, é concebida uma nova construção social e cultural acerca da criança e do seu papel social. Zilberman e Lajolo (1999) salientam que essas mudanças sociais decorreram da preocupação em preservar a infância. Essa nova visão sobre a criança motivou a produção de objetos industrializados, como o brinquedo, e também culturais, tendo como destaque o livro.

Zilberman e Lajolo (1999) afirmam que, no século XIX, outros autores foram consolidados como referências para a literatura infantil, entre eles estão os irmãos Grimm, Jacob e Wilhelm. Além dos escritores alemães, outros se destacaram por contribuírem para a consolidação da literatura infantil, como é o caso do dinamarquês Hans Christian Andersen.

Por muito tempo, a literatura infantil foi injustamente julgada como não confiável, pois muitos críticos, por estudarem superficialmente seus aspectos, atribuíram definições que inferiorizaram o seu caráter conceitual literário. Segundo Isabelle Jan1 (1973, p. 142-143 apud Hunt, 2010, p. 76):

Os críticos, sempre prontos a distribuir notas boas e más – estão preparados para avaliar esse “subproduto” por padrões acadêmicos e declarar que uma de suas produções é ou não é “literatura”, é ou não é “bem escrita” e que ela tem ou não chance de tornar-se um “clássico”.

Discussões escolásticas dessa ordem apenas disfarçam a verdade de que tais obras existem por si mesmas e não como degraus de uma escada até a leitura adulta.

O importante [...] não é se ela é ou não literatura, mas que ela deve ser para crianças; seu interesse e importância dependem dessa característica específica.

A importância da literatura, na verdade, não se restringe a critérios avaliativos, mas à apreciação para o público ao qual se destina. Sua definição depende de fatores relacionados à época, aos autores que abordam essa temática e também da editora. Por isso, é essencial que sejam categorizados e tratados com o mesmo rigor que os livros para adultos, pois, desse modo, estará sendo evidenciada a sua terminologia.

O conceito de literatura infantil, assim como o de criança, é complexo de ser definido, uma vez que é pensado e renovado a partir do contexto de determinada época, como aponta Coelho (2000). A concepção entendida, aqui, é que a literatura infantil é uma manifestação artística da palavra, uma vez que compreende as representações humanas e suas relações históricas, culturais, sociais e políticas. Assim, segundo Coelho (2000, p. 27): “a literatura infantil é, antes de tudo, literatura; ou melhor, é arte: fenômeno de criatividade que representa o mundo, o homem, a vida, através da palavra”.

A literatura infantil possibilita uma confrontação de sentimentos, e, ao mesmo tempo, de criação, a partir da sensibilidade do ambiente e cotidiano em que vivemos, causando diversas emoções sobre os leitores. Isso mostra que seu conceito está atrelado ao contexto que o leitor está inserido, uma vez que é produto da criação e representação da historicidade humana. A literatura é dinâmica pela fluidez das mentalidades de cada sociedade, cabendo aos professores atenderem a essas mudanças. Nesse sentido, os docentes devem orientar os alunos para um caminho coerente e consciente dos textos literários.

O ENSINO DA LITERATURA INFANTIL EM UMA PERSPECTIVA SIGNIFICATIVA DO TEXTO LITERÁRIO

Para Coelho (2000), a expressão “literatura infantil” já estaria associada, de imediato, a um sentido recreativo, pois a própria denominação sugere um caráter lúdico “a ideia de belos livros coloridos destinados à distração e ao prazer das crianças em lê-los, folheá-los ou ouvir suas histórias contadas por alguém” (COELHO, 2000, p. 29). Segundo a autora, até bem pouco tempo, a literatura infantil era tratada como brinquedo, sendo evidenciado apenas o seu aspecto lúdico, para se passar o tempo: “vista pelo adulto como algo pueril (nivelada ao brinquedo) ou útil (nivelada à aprendizagem ou meio para manter a criança entretida e quieta)” (COELHO, 2000, p. 30).

A literatura, de modo geral, é fundamental no processo de aprendizagem dos alunos, uma vez que contribui efetivamente para uma compreensão maior da realidade. Conforme Coelho (2000, p. 16): “os estudos literários [...] estimulam o exercício da mente; a percepção do real em suas múltiplas significações; a consciência do eu em relação ao outro”. A leitura proporciona uma visão mais ampla e diversa sobre a realidade que nos cerca, pois os livros literários possuem diversas estratégias, como a ironia e a metáfora, para abordar determinado assunto.

O texto literário possui um sentido em si mesmo, no qual se agrega a intenção que os autores objetivam provocar no leitor, e cabe aos professores entenderem essa relação e procurarem meios que levem os alunos a compreenderem que os textos literários possuem estruturas específicas e significados próprios. O trato com os textos literários, na escola, precisa ser pensando de forma elaborada e sistematizada para que não sejam cometidos equívocos. Conforme aponta Kleiman (2002), muitas vezes, o modo como o texto é abordado na sala de aula causa desmotivação nos alunos. Isso ocorre, segundo a autora, devido a algumas concepções errôneas presentes nas práticas de alguns docentes.

Kleiman (2002) apresenta dois tipos de concepções errôneas, a primeira concebe o texto como um “conjunto de elementos gramaticais”, e a segunda como “repositório de mensagens e informações”. Ambas não se referem ao aspecto estético do texto, dado que apenas reforçam “a crença de que o texto é apenas um conjunto de palavras cujos significados devem ser extraídos um por um” (KLEIMAN, 2002, p. 18).

Além dessas noções acerca do texto, Kleiman (2002) trata de outras relacionadas à leitura. A autora discute a “leitura como decodificação”, sendo aquela que corresponde a uma atividade automatizada na qual o aluno apenas decodifica e responde questões sobre informações que estão explícitas no texto. A outra concepção é a da “leitura como avaliação”, que consiste em um tipo de atividade na qual o aluno lê em voz alta, enquanto o professor avalia sua pronúncia, pontuação, compreensão etc. E, por fim, “a integração numa concepção autoritária de leitura”, na qual o texto é discutido a partir de uma única via interpretativa. A autora elenca tais concepções a partir de um estudo de campo baseado em observações na sala de aula. Observamos que, nas concepções apresentadas por Kleiman (2002), o texto e a leitura não são trabalhados em sala pelos docentes a partir de uma perspectiva literária e estética, não havendo estímulo para despertar a formação leitora.

Para que o ensino da literatura seja significativo, é preciso que o professor faça, através da mediação, com que os alunos percebam a literatura como sendo uma das ferramentas essenciais para aquisição do conhecimento, reflexão e criticidade. Desse modo, o docente possibilita que o leitor possa ir ao encontro dos sentidos do texto, e, consequentemente, criar significados próprios das leituras realizadas.

LETRAMENTO LITERÁRIO E FORMAÇÃO DO LEITOR

É na leitura e escrita dos textos literários que podemos compreender a história da comunidade na qual o indivíduo está inserido. Quando ele passa a se apropriar desses textos, consequentemente, tende a valorizar a sua cultura e adquirir o sentimento de pertencimento ao seu meio social. Colomer (2007) pontua que a educação literária serve para que as novas gerações entrem no debate contínuo sobre a cultura, em um sentido de reflexão sobre como são as construções e intepretações históricas que a configuram.

Dessa forma, o letramento literário é entendido como o uso efetivo da literatura na nossa realidade e vivência. Tal aspecto possibilita um leitor autônomo e consciente, que busca relacionar os textos lidos e sua realidade. Conforme Cosson (2009, p. 12): “o processo de letramento que se faz via textos literários compreende não apenas uma dimensão diferenciada do uso social da escrita, mas também, e, sobretudo, uma forma de assegurar seu efetivo domínio”.

Para entendermos o que é letramento literário, é fundamental a compreensão sobre o conceito de letramento, que, segundo Soares (2009), é uma definição difícil de ser delimitada, pois abrange diversos conhecimentos e habilidades. O letramento possui um significado que correlaciona ler e escrever, mas que transcende esse processo. Soares (2009, p. 40) comenta que é possível ser alfabetizado, e, ao mesmo tempo, não ser letrado, uma vez que: “o indivíduo letrado, indivíduo que vive em estado de letramento, é não só aquele que sabe ler e escrever, mas aquele que usa socialmente a leitura e a escrita, pratica a leitura e a escrita, responde adequadamente às demandas sociais de leitura e de escrita”.

Por consequência, o significado de letramento parte da premissa de que o indivíduo tenha consciência sobre as questões que são colocadas a partir do uso efetivo da leitura e escrita. E, nessa perspectiva, o indivíduo possa construir uma visão significativa sobre o mundo. Soares (2009, p. 37) esclarece que:

Socialmente e culturalmente, a pessoa letrada já não é a mesma que era quando analfabeta ou iletrada, ela passa a ter uma outra condição social e cultural – não se trata propriamente de mudar de nível ou de classe social, cultural, mas de mudar seu lugar social, seu modo de viver na sociedade, sua inserção na cultura – sua relação com os outros, com o contexto, com os bens culturais torna-se diferente.

Em consonância com essa assertiva, a definição de letramento literário surge a fim de proporcionar aos leitores consciência sobre o texto, no sentido de compreender seus diversos significados. A visão do ensino da literatura, a partir da definição de letramento literário, contribui para a superação da leitura de obras como mera reprodução, Cosson (2009, p. 23) afirma que “falta a uns e a outros uma maneira de ensinar que rompendo o circuito da reprodução ou da permissividade, permita que a leitura literária seja exercida sem o abandono do prazer, mas com o compromisso de conhecimento que todo saber exige”.

O letramento literário compreende a literatura para além da leitura de obras literárias, não é a mera decodificação de palavras. O letramento literário se configura como a realização efetiva dos significados dos textos nas práticas sociais, culturais e políticas, em uma perspectiva que os estudantes tenham compreensão do significado do texto.

É fundamental que a escola possibilite uma prática docente que favoreça ao estudante a elaboração do conhecimento criativo e sensível do seu lugar. De acordo com Cosson (2009, p. 17): “Na leitura e na escritura do texto literário encontramos o senso de nós mesmos e da comunidade a que pertencemos. A literatura nos diz o que somos e nos incentiva a desejar e a expressar o mundo por nós mesmos”. Isso é possível porque a literatura instiga o leitor a elaborar o seu próprio senso crítico.

Assim como qualquer conhecimento, ler literatura também é um saber aprendido, conforme aponta Cosson (2009). O que, de certa forma, impõe uma responsabilidade maior à escola, pois é, nesse espaço educacional, que, quase sempre, o leitor tem contato com a leitura pela primeira vez. E, nessa situação, é importante o papel do professor, pois ele é o mediador, tanto no que diz respeito à aprendizagem do texto literário como na formação do hábito leitor. De acordo com Kleiman (2002), é fundamental que esse profissional também tenha gosto pela leitura, que seja um leitor assíduo.

Nessa relação é fundamental que o professor, como mediador, compreenda que, para a verdadeira aprendizagem acontecer, é necessário ter um relacionamento dialógico com o aluno, segundo afirmam Braga e Silvestre (2002). Essa interação é essencial em todo o processo da leitura, uma vez que é importante a orientação do professor para a constituição efetiva do estudante como leitor. É fundamental que a leitura esteja relacionada a um senso de entendimento e pertencimento entre o leitor e o texto. Silva (1986, p. 26) afirma que:

Fruir o texto literário e crescer pessoalmente ou transformar-se politicamente são partes de um mesmo ato. Ao leitor do texto literário, cabe então, não só compreender, mas também imaginar como a realidade poderia ser diferente; não só compreender, mas transformar-se; não só transformar, mas sentir o prazer de estar transformando.

Consideramos, então, a partir dos apontamentos expressos no excerto citado, que o professor é elemento fundamental nesse processo, pois é ele quem fornece subsídios para o aluno alcançar uma maturidade leitora. Como aponta Silva (1986, p. 47): “aquilo que sei ou penso que sei sobre o ato de ler ou, ainda, a forma pela qual eu concebo ou leio a leitura enriquece ou empobrece, dinamiza ou paralisa, dirige ou desvia, conscientiza ou serve para alienar as ações relacionadas com a formação de leitores”. Então, faz-se necessário que os professores tenham propriedade do conteúdo a ser trabalhado na sala de aula, pois essa é uma maneira de contribuir para a formação de alunos leitores. A partir desse entendimento, é interessante refletir sobre práticas de ensino que garantam a leitura efetiva da literatura infantil, pois ignorar essas questões contribui para a exclusão de uma grande parte dos alunos.

CONCEPÇÃO DOCENTE SOBRE LITERATURA INFANTIL

A discussão teórica realizada, aqui, foi importante para que pudéssemos compreender sobre as peculiaridades da literatura infantil, sobre o ensino do texto e da leitura em sala de aula, mediante a concepção do letramento literário. A partir desses apontamentos, nos interessou conhecer a forma como é abordada a literatura infantil nas escolas públicas do ensino fundamental I. Para isso, escolhemos duas escolas2 de duas cidades localizadas no interior da região oeste da Bahia, Barreiras e Wanderley, o que nos possibilitou conhecer duas realidades e saber em que medida elas se aproximam e se distanciam. A escolha das escolas participantes desta pesquisa ocorreu porque uma das pesquisadoras residia no município de Wanderley, e as outras no município de Barreiras. Além disso, são municípios próximos da região oeste da Bahia, o que facilitou a locomoção das pesquisadoras para realizar a observação e coleta dos dados. Dentre as escolas desses municípios, as que participaram deste estudo responderam ao nosso convite em tempo hábil para a realização da pesquisa.

As professoras participantes foram escolhidas pela direção da escola, as quais consentiram a participação. Escolhemos, como instrumento para a coleta de dados, a aplicação de um questionário para as professoras. Esclarecemos, para as participantes, as eventuais dúvidas a respeito das questões. Foram um total de dez perguntas a serem respondidas. O questionário indaga sobre a concepção das professoras em relação à literatura infantil, finalidade, objetivos e metodologia utilizada em sala de aula.

As respostas estão agrupadas e apresentadas em quadros ao longo do texto. A professora de Barreiras será representada como professora B, e a professora de Wanderley como a professora W. É interessante levar em consideração que as turmas das professoras participantes da pesquisa são do ensino fundamental I, sendo que a professora B leciona para o segundo ano, e a professora W para o terceiro ano. A primeira pergunta é sobre como as professoras concebem a literatura infantil. As respostas estão apresentadas no quadro 01:


Quadro 1: Qual a sua definição de literatura infantil?
Fonte: Das autoras.

A partir das respostas das professoras B e W, presentes no quadro 01, é evidente que as duas profissionais concebem a literatura infantil como um tipo de literatura específica para o público infantil. Em acordo com essa concepção, Coelho (2000) ressalta que a singularidade da literatura infantil é determinada pela natureza da criança. Isso quer dizer que a literatura destinada a esse público deve corresponder a uma temática que esteja relacionada a assuntos cotidianos, a uma linguagem compreensível, o texto deve vir acompanhado de imagens que a criança consiga relacionar com objetos e seres da sua vivência. Esses aspectos do texto literário infantil devem atender às necessidades específicas do leitor.

Ao planejar o ensino da literatura, é preciso levar em consideração o modo como abordar o texto em sala de aula. Yunes e Pondé (1988) afirmam que o texto literário infantil deve partir do próprio meio da criança, contendo questões presentes em seu cotidiano. Os autores também argumentam que a literatura infantil, assim como a literatura para adultos, pode falar sobre assuntos sérios, pois tem o auxílio da fantasia. Assim, “ocorre uma renovação do recurso tradicional da fantasia, pelo jogo da intertextualidade [...] e pelo realismo que aparece quebrando tabus e preconceitos, lidando com os problemas cotidianos que não poupam a infância” (YUNES; PONDÉ, 1988, p. 46).

A segunda pergunta indaga sobre se as professoras entendem a literatura infantil como aspecto essencial na aprendizagem dos estudantes. Observemos o quadro a seguir:


Quadro 2: Na sua concepção, qual a finalidade da literatura infantil na aprendizagem dos alunos?
Fonte: Das autoras.

As professoras apresentam, em suas respostas, alguns aspectos fundamentais no trato com os livros literários, como criatividade, desenvolvimento das emoções e imaginação. Tais aspectos expressam o ensino da literatura infantil do ponto de vista do “discurso literário”. Segundo Yunes e Pondé (1988, p. 47): “o discurso literário abre perspectiva para a percepção do mundo do ponto da infância, traduzindo então suas emoções, seus sentimentos, suas condições existenciais em linguagem simbólica que efetue catarse e promova um ensaio geral da vida”. A concepção sobre o literário, presente nas respostas das professoras, possui um significado de conscientização acerca do ponto de vista emocional e racional. E como as professoras B e W atuam no ensino fundamental I, esse processo torna-se mais complexo, pois é um momento de aquisição da leitura e escrita. Nessa fase do ensino, os livros literários são uma ferramenta essencial, uma vez que estimulam a criatividade, a reflexão e a criticidade dos estudantes.

Tanto a professora B como a professora W relatam a finalidade da literatura infantil como um processo de aprendizagem, que constitui aspectos que promovem uma diversidade de habilidades e também de sensibilidade a partir das emoções provocadas pelos livros literários. Yunes e Pondé (1988, p. 47) afirmam que “a literatura pode [...] contribuir para alterar e valorizar o processo educativo, além de promover a comunicação através da arte”.

A terceira pergunta trata sobre os objetivos estipulados pelas professoras ao trabalhar com os livros literários na sala de aula. Vejamos:


Quadro 3: Quais são os seus principais objetivos ao trabalhar com os livros literários na sala de aula?
Fonte: Das autoras.

Yunes e Pondé (1988) abordam que o processo de iniciação literária é intrínseco ao sistema educacional, sendo imprescindível que esse processo passe pela sala de aula. Essa afirmativa nos possibilita refletir sobre os objetivos apontados pelas professoras ao trabalhar com os livros literários. Observamos que as docentes empregam a palavra “desenvolver”, tendo em vista a escola como o primeiro espaço de contato com os livros e a leitura.

Na resposta da professora B, podemos constatar o uso de vários objetivos para trabalhar com os livros, fica explícito que os textos possuem mais de uma finalidade, e que atuam em diversas expressões da criança. Entre as finalidades, a professora considera que o livro serve para a recreação, mas não especifica como acontece esse momento. A respeito das concepções literária e recreativa, consideramos que o literário abrange alguns aspectos, entre eles: o significado que o texto proporciona para o estudante a partir do enredo, da magia e da fantasia; a contextualização desse significado com a visão a partir da realidade do aluno; o entendimento do texto literário com sentido em si mesmo. Em relação ao recreativo, a consideração principal é o entendimento que os livros literários são uma ferramenta lúdica, e que não precisam estar, necessariamente, relacionados a um conteúdo ou a uma atividade avaliativa.

Para Coelho (2000), o ensino da literatura também pode apresentar uma conotação pedagógica, sendo essa uma prática mais recorrente nas escolas. Ao longo do tempo, as obras consideradas como literatura infantil transitaram por duas áreas: a da arte e a da pedagogia. Nessa lógica, Coelho (2000, p. 46) aponta:

Podemos dizer que, como objeto que provoca emoções, dá prazer ou diverte e, acima de tudo, modifica a consciência do mundo de seu leitor, a literatura infantil é arte. Sob outro aspecto, como instrumento manipulado por uma intenção educativa, ela se inscreve na área da pedagogia.

Inferimos que, no processo educacional, principalmente, no ensino fundamental I, separar esses dois aspectos, arte e pedagogia, é muito difícil. Além disso, Coelho (2000) assegura que esses dois fundamentos não se excluem.

O gosto pela leitura impulsiona uma infinidade de emoções, e isso remete à abordagem literária, pois é pensada nessa lógica. Em consonância a tais propósitos, tem-se a resposta da professora W, que afirma priorizar o gosto pela leitura ao trabalhar com os livros literários. Na condição de docentes do ensino fundamental I, conhecer esses objetivos é significativo para construir uma base sólida à formação de um leitor consciente. Colomer (2007, p. 60) faz a seguinte colocação sobre a aquisição do processo da leitura:

O itinerário infantil das leituras, iniciado na primeira infância, ampliam-se à medida que as crianças crescem. Mas isso não significa que elas tenham que esperar a chegada a algum momento determinado de sua formação para desfrutar da experiência literária. Ao contrário, é a sua participação em um ato completo de comunicação literária o que lhes permite avançar por esse caminho.

A próxima pergunta diz respeito à metodologia empregada por cada uma das professoras em sala de aula. Vejamos o quadro a seguir:


Quadro 4 : Qual a metodologia mais utilizada para o ensino dos livros literários?
Fonte: Das autoras.

Notamos que as duas professoras apontam um dado significativo, que é a inclusão da família no processo de leitura dos livros literários. Embora não evidenciem como acontece o processo da leitura em casa, é interessante destacar que, segundo Cosson (2009, p. 62), “o professor não deve vigiar o aluno para saber se ele está lendo o livro, mas sim acompanhar o processo de leitura para auxiliá-lo em suas dificuldades, inclusive aquelas relativas ao ritmo do leitor”.

A professora B indica que há “livre escolha de livro para ler em casa”, e a professora W descreve “leitura livre nos momentos de leitura em sala de aula”. A partir do que afirma Cosson (2009), é importante um acompanhamento depois dessa leitura, que foi realizada em casa, para orientação nas dificuldades e socialização das aprendizagens. Levando em consideração que as professoras não relatam como é realizada a escolha do livro que será lido em casa, é válido mencionar que a escola pode orientar o processo de leitura dos textos literários, pois, caso contrário, pode não ocorrer a interação entre leitor e livro.

Outro dado interessante que as professoras apontam é que o contato com a leitura de livros não ocorre apenas em sala de aula, mas, também, em outros espaços, como o da biblioteca. Sobre esses dados, Yunes e Pondé (1988, p. 29) consideram que:

Se quisermos ampliar o processo de reflexão e crítica para todos, é preciso que o contexto político e cultural favoreça o diálogo, a associação de grupos e instituições interessados na promoção da leitura; fomente a criação e dinamização de bibliotecas; enfim transforme o ato de ler e de pensar numa rotina comum a todos os cidadãos.

É fundamental que o contato com os livros literários seja uma rotina no dia a dia dos estudantes, para que a leitura seja um hábito, além de vista como algo inerente à aquisição do conhecimento.

A próxima pergunta, apresentada no quadro 05, versa sobre as escolhas dos livros e a relação com a comunidade do leitor.


Quadro 5: A leitura e escrita dos textos literários se relacionam com a história da comunidade? Se sim, explique como isso ocorre. Se não, comente comoé realizada a escolha dos livros literários para o ano letivo.
Fonte: Das autoras.

A importância de relacionar os livros com a história da comunidade é algo fundamental no processo de leitura e escrita, pois possibilita que os alunos sintam pertencimento ao seu meio social, e também à escola. Logo, os leitores participam como sujeitos nesse espaço. No que tange a essa afirmação, Braga e Silvestre (2002) afirmam que o entendimento do texto ocorre a partir da relação entre texto e leitor. Quanto mais o leitor conhecer sobre o assunto que trata a obra, mais fácil será a interação com o texto e a criação de relações para a construção de significados. Assim, é importante que o aluno, na posição de leitor, aproprie-se da leitura e teça aproximações entre a sua realidade e a literatura.

A resposta da professora B demonstra uma preocupação em selecionar os livros de acordo com a faixa etária das crianças, fator que é fundamental para entendimento da leitura como um todo. A resposta da professora W é sucinta ao apontar que não relaciona as histórias com aspectos que envolvem a vida dos alunos, e que usa os livros da biblioteca. Nas repostas das docentes, fica claro que os livros chegam às escolas através de programas do governo, conforme a professora B: “de acordo aos programas desenvolvidos pelo MEC”. Ainda, conforme a sua resposta, parece que há a possibilidade de escolher alguns livros, quando afirma analisar um catálogo de obras; já a professora W afirma que os livros são: “fornecidos pelo Programa Nacional do Livro Didático (PNLD)”, não esclarecendo, ou desconhecendo, como é realizada a escolha das obras.

A partir dessas respostas, duas observações merecem ênfase. Primeiro, em relação à participação das professoras nas escolhas dos livros, que é um aspecto fundamental para o ensino de literatura, pois, nesse momento, a professora pode selecionar as obras mediante a realidade da comunidade escolar. Sobre esse aspecto, Braga e Silvestre (2002, p. 30) dizem que: “no processo de mediação, primeiro, o professor precisa ter muito claro porque escolheu aquele texto e não outro, o que pretende com ele; enfim, determinar sua intenção de leitura”. Isso está presente na resposta da professora B, que relata preocupação em escolher os livros a partir da faixa etária dos alunos e da temática presente nos livros.

Um outro aspecto é a relação do livro com a comunidade, que, de certa forma, correlaciona essa “intenção de leitura” tratada pelas autoras Braga e Silvestre (2002). Ao escolher uma obra que tenha elo com a vivência do seu aluno, o professor possibilita que ele se identifique com a narrativa. Para Kleiman (2002, p. 10): “ao lermos um texto, qualquer texto, colocamos em ação todo o nosso sistema de valores, crenças e atitudes que refletem o grupo social em que se deu nossa sociabilização primária, isto é, o grupo social”.

A sexta pergunta partiu da intencionalidade de saber se as professoras tangenciam os livros com os conteúdos abordados. As respostas estão agrupadas no quadro 06:


Quadro 6: Você relaciona os livros literários trabalhados em sala de aula com os demais conteúdos? Se sim, comente como isso ocorre.
Fonte: Das autoras.

Observamos, no quadro 06, que as duas professoras utilizam os livros literários com propósito pedagógico. De acordo com Coelho (2000), o ensino, com o caráter lúdico, dos livros literários proporciona aos leitores uma viagem ao universo do saber, e a aprendizagem, nesse caso, acontece de maneira eficaz.

A professora B mencionou a contribuição do ensino literário para o letramento nos vários componentes curriculares, o que nos remete a pensar que o ensino vai além do propósito de desenvolvimento da prática da leitura e escrita. Silva (1986) diz que o ato de ler ajuda a não apenas conhecer a cultura, mas, para além disso, a praticá-la. A leitura é um hábito sociocultural, que exige do leitor esforço, mas também desperta prazer nesse processo. A literatura, compreendida e utilizada em sala de aula, de acordo com as respostas das professoras B e W, é com propósito pedagógico, com o objetivo de complementar, ou mesmo introduzir um tema trabalhado nas aulas e não apenas pelo prazer.

A próxima pergunta foi do tipo objetiva e teve as seguintes alternativas: desenvolvimento na prática da leitura e escrita, desânimo relacionado às atividades de leitura e escrita, interesse pelos livros literários e no uso social da leitura e escrita. As alternativas marcadas pelas professoras estão presentes no quadro 07:


Quadro 7: De acordo com a sua compreensão acerca da literatura, a utilização dos livros literários nas aulas favorece em quais aspectos o aprendizado dos alunos?
Fonte: Das autoras.

A partir da análise do quadro 07, é possível perceber que as professoras B e W compreendem a literatura na perspectiva do letramento literário. As professoras expressam, em suas respostas, a importância de ler textos literários em sala de aula. Ambas afirmam que utilizam livros em suas aulas e dizem perceber que isso desperta o interesse dos alunos pela leitura. Nessa conjectura, na fala da professora B, a utilização dos livros literários em sala de aula favorece o: “desenvolvimento na prática da leitura e escrita, e interesse pelos livros literários e no uso social da leitura e escrita”; já a professora W assinala as seguintes alternativas: “interesse pelos livros literários e no uso social da leitura e escrita”. Em consonância a esses apontamentos, Cosson (2009, p. 16) afirma que:

A prática da literatura, seja pela leitura, seja pela escritura, consiste exatamente em uma exploração das potencialidades da linguagem, da palavra e da escrita [...] é no exercício da leitura e da escrita dos textos literários que se desvela a arbitrariedade das regras impostas pelos discursos padronizados da sociedade letrada e se constrói um modo próprio de se fazer dono da linguagem que, sendo minha, é também de todos.

Na questão 08, nos interessa saber em quais momentos as professoras permitem que os estudantes façam uma leitura que apreciam, e para qual não há, necessariamente, uma atividade avaliativa a ser respondida. Vejamos:


Quadro 8: A leitura apreciativa dos livros literários acontece, geralmente, quando:
Fonte: Das autoras.

Com base nas respostas das professoras B e W, contidas no quadro 08, observamos que a atividade apreciativa acontece, geralmente, quando prescrita no planejamento das aulas, e, segundo a professora B, também “quando há um tempo sobrando”. Essa conjuntura nos remete à seguinte reflexão de Colomer (2007, p. 43):

Talvez o principal problema do modelo “leitura por prazer” seja que ele assimila totalmente a leitura escolar com uma leitura do tipo particular, de maneira que o prazer designa a aproximação pessoal, enquanto que a obrigação de ler se situa no terreno escolar da utilidade.

Um ponto satisfatório nas respostas das professoras é que ambas fazem o uso dos livros literários. Uma consideração a fazer é que não explicitam como é realizada a leitura voltada para o deleite em sala de aula. No entanto, de acordo com as respostas de ambas, existe, dentro do planejamento, uma preocupação com a realização de uma leitura dos livros literários que seja prazerosa.

A próxima pergunta versa sobre a importância do professor como mediador. As respostas das professoras estão no quadro a seguir:


Quadro 9: A mediação do professor deve ser considerada importante no desenvolvimento da prática da leitura do aluno? Por quê?
Fonte: Das autoras.

Com base no quadro 09, percebemos que a professora W responde, de forma sucinta, que a mediação é responsável por estimular o aluno a apreciar a leitura e a escrita. Já a professora B destaca a necessidade do professor ser um leitor assíduo para poder transmitir esse interesse. Isso está em acordo com o que Cosson (2009) e Kleiman (2002) apontam sobre a importância de o profissional docente ser um leitor.

O professor é responsável pelo esclarecimento de dúvidas relativas à história, e é também aquele que verifica se o texto está sendo lido corretamente (COSSON, 2009). No quadro 09, também é possível perceber que as professoras B e W reconhecem a relevância do auxílio do profissional docente no processo de desenvolvimento da prática da leitura do aluno. Sendo assim, a mediação, como aponta Coelho (2000), é indispensável na maior parte das etapas de desenvolvimento do leitor.

Nessa conjuntura, além do prazer pela leitura, a professora W esclarece que a mediação contribui para o estímulo de participação dos alunos nas aulas, e facilita também o processo de ensino e aprendizagem. Com base nas respostas das professoras pesquisadas, observamos que, embora tenha respondido de maneira sintética, a professora B também afirma utilizar os livros para fins literários. Na fala da professora W, o que prevalece é a preocupação com a leitura e escrita.

A última pergunta do questionário aplicado às docentes participantes trata sobre a utilização dos livros literários no processo de ensino e aprendizagem. A pergunta foi objetiva e continha as seguintes alternativas: conhecimento crítico dos alunos, a apreciação da leitura e escrita dos alunos, o conhecimento crítico e apreciação da leitura e escrita. Vejamos:


Quadro 10: O que é priorizado no processo de ensino e aprendizagem quando são utilizados os livros literários?
Fonte: Das autoras.

Com a análise do quadro 10, evidencia-se que, nas práticas docentes das professoras participantes, os textos literários são utilizados para promover o conhecimento crítico dos alunos, e também para a apreciação da leitura e escrita. O ensino da literatura é voltado para a formação de indivíduos reflexivos e críticos.

As respostas das professoras B e W são análogas. Sendo assim, apesar de não estar explícito como fazem isso, buscam, em seu trabalho, o desenvolvimento da criticidade e incentivo à leitura. Posto dessa forma, quanto mais leitores assíduos, maior o número de alunos bem instruídos e conscientes das questões presentes na sociedade, pois, como afirma Silva (1986, p. 36): “o ato de ler, se executado dentro de moldes críticos, é um ato perigoso”.

Todavia, a reflexão e criticidade não é algo fácil de alcançar, a depender da forma que é buscada, formam-se pessoas que criticam sem saber, de fato, o que estão afirmando. Conforme Candido (2004), um leitor reflexivo e crítico pode se posicionar frente às injustiças sociais. Porém, se os textos literários não tiverem nenhum critério de seleção, em lugar de incentivar a leitura, o efeito produzido será o oposto, como declara Silva (1986).

PRÁTICA DOCENTE E ENSINO DA LITERATURA INFANTIL

Os dados, aqui, analisados foram adquiridos a partir das observações realizadas nas aulas correspondentes às disciplinas de língua portuguesa e produção textual das professoras participantes da pesquisa e registradas em um diário de campo. As aulas foram observadas durante dois dias, da professora B, nos dias 01/08/2019 e 07/08/2019, e da professora W, nos dias 05/08/2019 e 07/08/2019.

As observações foram realizadas com o objetivo de identificar como as professoras abordam a literatura infantil na sala de aula. Desse modo, apontamos, na análise, os aspectos que percebemos na prática docente das professoras. Ainda, relacionamos os apontamentos verificados nas observações com as respostas das professoras B e W obtidas através do questionário aplicado.

Dividimos a análise dos dados em duas cenas. A cena 01 se refere ao modo como as professoras realizam o trabalho com os livros literários. Na cena 02, discutimos como cada professora utiliza o texto, tendo como foco as atividades de leitura e escrita.

Cena 1

No primeiro dia de observação, na turma da professora B, foi trabalhado o livro É mentira da barata, de May Shuravel. A professora B destaca, primeiramente, os elementos da capa do livro, o título e o nome da autora. Em seguida faz a leitura da obra em voz alta para a turma. Durante esse momento, interage com os alunos, realiza questionamentos acerca da narrativa, buscando a participação de todos.

Destacamos, como exemplo, dessa interação com os alunos, o momento que a professora os convida para cantar a música popular “A barata diz que tem”3. A professora explicou que o livro trabalhado é uma adaptação da referida música. Sendo assim, nos momentos do livro em que a barata se vangloria pelos seus pertences, a professora parava a leitura e cantava com os alunos a música, além de mostrar as imagens do livro que retratavam a cena contada. A professora B, após finalizar a leitura do livro, questionou os alunos sobre o que eles haviam compreendido, e quais as passagens que consideravam essenciais à narrativa.

No segundo dia, a professora B trabalhou com o poema “A Chácara do Chico Bolacha”, de Cecília Meirelles. A professora B fez a leitura em voz alta, mas, antes, pediu para que os alunos fechassem os olhos e fossem imaginando como era a chácara descrita no poema. Depois lançou algumas questões sobre a temática do poema, como: “O que tinha na chácara?” e “A chácara pertencia a quem?”.

Nessa primeira cena da professora B, podemos observar alguns pontos relevantes. Primeiramente é o modo como inicia a aula. Nos dois dias que observamos, ela manteve o mesmo método, começar com leitura de textos. Em relação à dinâmica da leitura, é interessante mencionar que a professora buscou representar as ações que ocorriam nas histórias, modulando o tom da voz quando necessário.

Desse modo, a professora B, nesses dois momentos, procurou, de forma prazerosa, contar a história, o que condiz com sua resposta sobre a finalidade da literatura infantil, que foi apresentada no quadro 02 do tópico anterior: “é um caminho para desenvolver a imaginação, emoções”. Mostrando, nesse primeiro momento, um trabalho que perpassa pelo viés literário.

No primeiro dia de observação da turma da professora W, foi trabalhado um texto informativo4 sobre a cultura da cidade de Wanderley. Antes do trabalho com o texto, a professora falou sobre a cultura do munícipio. Nesse primeiro momento, ela apresentou alguns slides com imagens históricas do munícipio, fotos antigas e atuais. Depois disso solicitou aos alunos que comparassem as fotos apresentadas: “O que permaneceu igual? O que mudou?”.

A professora W, no segundo dia de observação, trabalhou com o texto O Sumiço do Rabinho5. A professora fez a explanação do título, e, em seguida, fez a leitura do texto, apresentando os personagens através de figuras coloridas. Os alunos demonstravam empolgação com a história contada. Então, a professora para de contar no momento que considera mais empolgante da narrativa, e solicita aos alunos continuarem a história a partir da passagem que ela havia parado, escrevendo o desenvolvimento e o final. Essa estratégia estimulou a criatividade dos estudantes, uma vez que cada um contou como imaginava o final da narrativa.

Podemos observar, nas aulas da professora W, aspectos interessantes, alguns que se assemelham e outros que diferem das aulas da professora B. Em relação às semelhanças, está a preocupação em estimular a participação dos alunos. A professora W estimulou e solicitou os alunos a serem autores da história contada. Essa atividade também condiz com a sua resposta sobre a finalidade da literatura infantil, apresentada no quadro 02 do tópico anterior, uma vez que a docente afirma que essa arte contribui para “estimular a criatividade [...] e imaginação”.

Em relação ao fato das professoras incentivarem a participação dos alunos nas aulas, Cosson (2009) afirma que, quando o leitor, seja ele adulto ou criança, adentra na leitura com situações que permitem que ele interaja com o texto, há um maior entusiasmo. E isso foi constatado na observação, pois o momento de maior interação, e também de animação, dos estudantes correspondeu à realização da atividade de escrita do desenvolvimento e final da história.

Sobre a importância da literatura na escola, Cosson (2009, p. 17) afirma que a literatura torna o mundo acessível, pois transforma sua “materialidade em palavras de cores, odores e sabores e formas intensamente humanas”. Isso mostra o quanto a literatura é importante na formação do pequeno leitor, pois contribui para o entendimento de conteúdos que seriam complexos, tornando-os compreensíveis, como é o caso da temática sobre a morte.

Cena 02

No primeiro dia de observação, a professora B, depois da leitura do livro É mentira da barata, de May Shuravel, conversou com os alunos sobre a obra lida. Nessa conversa a professora mencionou algumas questões, dentre elas, que o “tipo de história representada pelo livro é feita para divertir o leitor”, mas não mencionou o porquê, afirmou que não se tratava de “uma história real” e “que existem vários tipos de textos”, citando como exemplo um texto informativo que já havia sido trabalhado em sala.

A professora B, depois da breve exploração do livro, iniciou, então, uma abordagem voltada para o conteúdo gramatical, propôs uma atividade de separação de sílabas a partir de palavras retiradas do livro É mentira da barata. Por último, escreveu algumas palavras do livro no quadro, solicitando que todos os alunos fizessem a leitura. Enquanto os estudantes liam, a professora chamava atenção para as palavras que tinham a consoante “r”, a letra estudada da semana. Em seguida, pediu que cada aluno formasse uma frase a partir das palavras escritas no quadro.

A professora B, no segundo dia da observação, trabalhou com o poema “A Chácara do Chico Bolacha”, de Cecília Meireles, em um cartaz. Os alunos leram o poema junto com a professora. Em seguida, a docente trabalhou a parte estrutural do poema e tratou sobre os versos e as estrofes. A partir da leitura de cada estrofe, a professora ia perguntando aos alunos quais palavras rimavam, posteriormente, anotava, no quadro, as palavras apontadas pelos alunos. Por último, solicitou que os alunos realizassem a releitura do poema através de um desenho.

Podemos observar, na cena 02, algumas questões peculiares concernentes à cena anterior, pois a professora B aborda o texto literário com o foco na aquisição da leitura e da escrita. Essa cena da professora B corrobora a sua resposta apresentada no quadro 07 do tópico anterior, quando ela afirma que os livros literários favorecem o “desenvolvimento na prática da leitura e escrita”.

A professora W, no primeiro dia de observação, explanou sobre aspectos culturais do município de Wanderley. Convidou uma artesã da cidade para confeccionar um tapete em sala de aula e falar um pouco sobre a sua arte. A artesã explicou e demonstrou como o tapete era feito, em seguida, convidou todos os alunos para colaborarem com a confecção. A professora W distribuiu um texto informativo sobre a temática aos alunos, para uma leitura individual e silenciosa. Após a leitura, foi realizada uma atividade interpretativa que consistia em uma produção textual. Ao final, cada aluno fez a leitura do seu texto para a classe.

A professora W, no segundo dia de observação, entregou aos alunos o texto O Sumiço do Rabinho, contendo apenas a introdução da história. Assim, cada aluno teria que dar continuidade ao enredo. A produção foi realizada com o auxílio da professora. Após a escrita, cada aluno socializou a sua história em sala, lendo-a em voz alta. Esse momento, realizado pela professora W, de trabalhar com a leitura e escrita, é semelhante à resposta que apresentou no quadro 02 do tópico anterior: “a literatura infantil contribui para aquisição da leitura e escrita”.

Uma questão nos chamou atenção com relação à segunda cena da professora W. A professora trabalhou com um texto informativo acerca da cultura da cidade de Wanderley. Para Colomer (2007, p. 35): “os professores sempre se inclinaram para os textos informativos, considerando-os fáceis de entender e de controlar ante as sutilezas das leituras literárias”. A escolha dos livros informativos, em lugar dos livros literários, pode acontecer em razão da facilidade de lidar com eles, uma forma prática de se ensinar leitura e escrita (COLOMER, 2007). Já o trabalho com o literário envolve discussões que vão além do ensinar e aprender. Desse modo, a professora W trabalhou com o texto informativo com o objetivo de esclarecer para os alunos fatos da sua realidade.

É relevante mencionar que o texto literário também é uma fonte de informação, porém, as questões representadas pela literatura envolvem, sobretudo, criação, emoção e imaginação. Portanto, a literatura transforma o leitor em sujeito, no sentido de que ele constrói novos significados a partir das informações dos livros literários. Logo, a escolha de não trabalhar com o literário deixa de fora todas essas contribuições da literatura.

Por que a leitura é fundamental para a criatividade?

A leitura estimula o raciocínio, melhora o vocabulário, aprimora a capacidade interpretativa, além de proporcionar ao leitor um conhecimento amplo e diversificado sobre vários assuntos. Ler desenvolve a criatividade, a imaginação, a comunicação, o senso crítico, e amplia a habilidade na escrita.

É importante que se compreenda a leitura como processo ativo?

TÓPICO 1 | O SENTIDO DA LEITURA 5 3 LER É CONSTRUIR SIGNIFICADOS É importante que se compreenda a leitura como um processo ativo. O indivíduo, ao ler o texto, constrói o significado. É como se ambos entrassem num diálogo, em que o objetivo final é a comunicação e esta só se faz pela interação.

Quanto maior a experiência cultural do indivíduo maior será a sua eficácia no processo de leitura?

(BAKHTIN, 1997, p. 333). O leitor confirma ou rejeita as suas hipóteses e assimila a nova informação, ajustando-a àquela que já possui. Nessa perspectiva, quanto maior a experiência cultural do indivíduo, maior será a sua eficácia no processo de leitura, que, por sua vez, trará novas informações culturais.

E pela literatura que podemos viajar nas páginas do tempo e dialogar com pessoas de épocas distantes?

É pela literatura que podemosviajar” nas páginas do tempo e dialogar com pessoas de épocas distantes. É na atividade de leitura do literário que está a possibilidade de conhecer o ambiente, a civilização, a mitologia, o conhecimento e o imaginário que se constitui pela literatura.

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