O que é a qualificadora de meio cruel?

O que é a qualificadora de meio cruel?

DOLO EVENTUAL E A QUALIFICADORA DO MEIO CRUEL

1. (DJUS) Para o STJ, a qualificadora do meio cruel (art. 121, § 2º, inciso III, do CP) é compatível com o dolo eventual. C/E?

Vejamos o caso concreto decidido (com adaptações):

Éder, conduzindo sua caminhonete com habilitação suspensa, desrespeitou a preferência de passagem do pedestre/vítima e o atropelou em um cruzamento. Após o atropelamento, mesmo tendo sido advertido por pessoas que estavam no local, acelerou muito o automóvel e fugiu, arrastando a vítima por aproximadamente 500 metros, tendo assim assumido e consentido com o risco de produzir o resultado morte, o que de fato ocorreu. Em razão disso, o MP denunciou Éder pela prática de homicídio qualificado em razão do meio cruel (art. 121, § 2º, inciso III, do CP). Nessa situação, para o STJ, inexiste incompatibilidade entre o dolo eventual e o reconhecimento do meio cruel para a consecução da ação. C/E?

COMENTÁRIO

Gabarito: CERTO. Para o STJ, a qualificadora do meio cruel (art. 121, § 2º, inciso III, do CP[1]) é COMPATÍVEL com o dolo eventual. Isso porque, o dolo eventual não exclui a possibilidade de a prática delitiva envolver o emprego de meio mais reprovável, como veneno, fogo, explosivo, asfixia, tortura ou outro meio insidioso ou cruel. Em outras palavras, não há que se falar em incompatibilidade entre o dolo eventual e a qualificadora do meio cruel (art. 121, § 2º, inciso III, do CP), pois o dolo do agente, seja direto ou indireto, não exclui a possibilidade de o homicídio ter sido praticado com o emprego de meio mais reprovável. Insta salientar que o STJ também reconhece a compatibilidade entre o dolo eventual e as qualificadoras de ordem subjetiva, como o motivo torpe e o motivo fútil (AgRg  no RHC 87.508/DF, Rel. Ministro Reynaldo Soares da Fonseca, Quinta Turma, DJe 3/12/2018). Por fim, cumpre destacar que o homicídio híbrido, mais conhecido como homicídio qualificado-privilegiado, ocorre quando, ao mesmo tempo, há a presença de uma ou mais causas que qualificam o crime, desde que de natureza objetiva (ex.: com emprego de veneno, fogo, explosivo, asfixia, tortura ou outro meio insidioso ou cruel ou à traição, de emboscada, ou mediante dissimulação ou outro recurso que dificulte ou torne impossível a defesa do ofendido), e outra que torna o homicídio privilegiado (ex.: relevante valor social ou moral). Desse modo, o homicídio pode ser qualificado e privilegiado (art. 121, § 1º do CP[2]) ao mesmo tempo, desde que as qualificadoras sejam de natureza objetiva (art. 121, § 2º, incisos III e IV, do CP[3]). É pacífico no STF e no STJ que o homicídio qualificado-privilegiado (ou híbrido) não é considerado crime hediondo.

STJ. 6ª Turma. REsp 1.829.601/PR, Rel. Min. Nefi Cordeiro, julgado em 04/02/2020 (INFO/STJ 665).

[1] CP, art. 121. Matar alguém: (…) § 2° Se o homicídio é cometido: III – com emprego de veneno, fogo, explosivo, asfixia, tortura ou outro meio insidioso ou cruel, ou de que possa resultar perigo comum; (…) Pena – reclusão, de doze a trinta anos. (…).

[2] CP, art. 121. Matar alguém: Pena – reclusão, de seis a vinte anos. § 1º Se o agente comete o crime impelido por motivo de relevante valor social ou moral, ou sob o domínio de violenta emoção, logo em seguida a injusta provocação da vítima, o juiz pode reduzir a pena de um sexto a um terço. (…).

[3] CP, art. 121. Matar alguém: (…) § 2° Se o homicídio é cometido: III – com emprego de veneno, fogo, explosivo, asfixia, tortura ou outro meio insidioso ou cruel, ou de que possa resultar perigo comum; IV – à traição, de emboscada, ou mediante dissimulação ou outro recurso que dificulte ou torne impossível a defesa do ofendido; (…) Pena – reclusão, de doze a trinta anos. (…).

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DOLO EVENTUAL E A QUALIFICADORA DO MEIO CRUEL

O que é a qualificadora de meio cruel?

Informativo 65 - Qualificadoras - descrição na denúncia - necessidade

Caros colegas

O tema desta semana é simples. Objetiva lembrar a necessidade do órgão ministerial, ao elaborar a denúncia de fato criminoso, descrever, de forma concreta, o fato criminoso e as circunstâncias constitutivas das qualificadoras.

A regra, inserta no art.41, do CPP e exigida pelos princípios da ampla defesa e também da correlação entre acusação e sentença, consiste na narração que especifique a circunstância fática que configurou a qualificadora prevista no tipo legal. Vale dizer, ao invés de apenas se utilizar de expressões rotineiramente excluídas pelos Tribunais (como agindo " por vingança ", "mediante meio cruel ", "por ciúmes"), devem ser descritas, efetivamente, quais as circunstâncias constitutivas das qualificadoras. Exemplificando o raciocínio: ao invés de usar a expressão " vingança " na denúncia, melhor é descrever que o denunciado "cerceou a vida da vítima motivado pelo não pagamento de dívida de tráfico...., o que se constitui em motivo torpe"; ao invés de falar genericamente em "meio cruel", descrever que o denunciado demonstrou ausência de insensibilidade moral e falta de piedade, causando sofrimento atroz e desnecessário à vítima, através de reiterados golpes de martelo em diversas partes do seu corpo..., o que se constitui em meio cruel; ao invés de falar "ciúmes", esclarecer que o denunciado assim agiu em razão da vítima manter relacionamento amoroso com fulano de tal.....

Para ilustrar a causa da nossa preocupação diante da ausência da correta descrição das qualificadoras, encaminhamos, em anexo, decisões do TJPR excluindo-as em razão da lacuna na denúncia, mediante a fundamentação de que " na espécie não se está afastando as qualificadoras em decorrência da ausência de provas, mas, sim, em virtude de os fatos narrados na denúncia não configurarem nenhuma das qualificadoras admitidas na pronúncia " (TJ/PR Acórdão 19232 Processo: 332727-9 Recurso em Sentido Estrito Comarca: Maringá Vara: 4ª Vara Criminal Natureza: Criminal Órgão Julg.: 1ª Câmara Criminal Relator: Desembargador Jesus Sarrão Dados da Publicação: DJ 7186 18/08/2006) e de que " considerado que a denúncia não se refere à reiteração de golpes a caracterizar meio cruel na prática do homicídio, somado a circunstância de que a mera reiteração de golpes de cassetete no contexto fático não configura meio cruel, deve-se excluir da decisão de pronúncia a qualificadora do inc. III, do § 2.º do art. 121 do Código Penal. (TJ/PR Nº do Acórdão: 21751 Órgão Julgador: 1ª Câmara Criminal Tipo de Documento: Acórdão Comarca: Umuarama Processo: 0413180-6 Recurso: Recurso em Sentido Estrito Relator: Francisco Cardozo Oliveira Julgamento: 27/09/2007 Ramo de Direito: Criminal Decisão: Unanime Dados da Publicação: DJ: 7474 19/10/2007) .

Por outro lado, mostrando a importância de uma correta descrição, segue também decisão do STJ mantendo duas qualificadoras em homicídio, porque após analisar a denúncia, a 5ª. Turma concluiu que " As qualificadoras incluídas (motivo torpe e diminuição da resistência da vítima) foram devidamente descritas na denúncia, não havendo falar em inépcia.(....) Como se vê, há descrição do fato principal e de circunstâncias constitutivas das qualificadoras, embora estas tenham sido expostas de modo conciso, condensado". (STJ Processo HC 30137/SP HABEAS CORPUS 2003/0155603-1 Relator(a) Ministro FELIX FISCHER (1109) Órgão Julgador T5 - QUINTA TURMA Data do Julgamento 18/11/2003 Data da Publicação/Fonte DJ 15.12.2003 p. 339 destaques nossos)

Atenciosamente,

Luiz Eduardo Trigo Roncaglio

Procurador de Justiça Coordenador

Rosangela Gaspari

Promotora de Justiça

1 MEIO CRUEL DESCRIÇÃO NA DENÚNCIA - AUSENCIA

Ementa: DECISÃO: ACORDAM os Desembargadores e o Juiz Convocado integrantes da Primeira Câmara Criminal do Tribunal de Justiça, por unanimidade de votos, CONHECER do Recurso em Sentido Estrito e DAR-LHE PROVIMENTO PARCIAL, nos termos do voto do Relator. EMENTA: DECISÃO DE PRONÚNCIA - RECURSO EM SENTIDO ESTRITO - TENTATIVA DE FURTO E DE HOMICÍDIO QUALIFICADOS - EMENDATIO LIBELLI - PRESENTES NA DENÚNCIA ELEMENTARES DO TIPO DE TENTATIVA DE FURTO E DE HOMICIDIO QUALIFICADOS JUSTIFICA-SE A ADEQUAÇÃO DA IMPUTAÇÃO PELO INSTITUTO DA EMENDATIO LIBELLI - TENTATIVA DE FURTO QUALIFICADO PELO ROMPIMENTO DE OBSTÁCULO E CONCURSO DE PESSOAS - QUANDO OS AGENTES LUTAM COM A VÍTIMA QUE TENTA RETOMAR A COISA SUBTRAIDA DE DENTRO DE VEÍCULO MEDIANTE DESTRUIÇÃO DE VENTAROLA PODE CONFIGURAR-SE O DELITO DE TENTATIVA DE FURTO QUALIFICADO - QUALIFICADORA DO MEIO CRUEL - A REITERAÇÃO DE GOLPES EM CONTEXTO DE LUTA NÃO CONFIGURA MEIO CRUEL A QUALIFICAR O DELITO DE TENTATIVA DE HOMICIDIO - DIREITO A LIBERDADE PROVISÓRIA - QUANDO A SITUAÇÃO CAUTELANDA INDICA A EXISTÊNCIA DE AMEAÇAS POR PARTE DOS ACUSADOS A PARENTES DA VÍTIMA QUE FAZ SUGERIR CLIMA DE ANIMOSIDADE JUSTIFICA-SE A MANUTENÇÃO DA PRISÃO PREVENTIVA ATÉ O JULGAMENTO PELO TRIBUNAL DO JÚRI PARA ASSEGURAR A INSTRUÇÃO DO PROCESSO CRIMINAL E A GARANTIA DE APLICAÇÃO PENAL E DA ORDEM PÚBLICA - INTERPRETAÇÃO E APLICAÇÃO DOS ART. 383, 384 E 408 DO CÓDIGO DE PROCESSO PENAL E DOS ART. 121 E 155 DO CÓDIGO PENAL - RECURSO CONHECIDO E PARCIALMENTE PROVIDO.

(TJ/PR Nº do Acórdão: 21751 Órgão Julgador: 1ª Câmara Criminal Tipo de Documento: Acórdão Comarca: Umuarama Processo: 0413180-6 Recurso: Recurso em Sentido Estrito Relator: Francisco Cardozo Oliveira Julgamento: 27/09/2007 Ramo de Direito: Criminal Decisão: Unanime Dados da Publicação: DJ: 7474 19/10/2007)

EMENTA: 1) RECURSO EM SENTIDO ESTRITO. RÉU PRONUNCIADO PELA PRÁTICA DE HOMICÍDIO TRIPLAMENTE QUALIFICADO (ART. 121, § 2º, II, III E IV, DO CÓDIGO PENAL). PEDIDO DE EXCLUSÃO DAS QUALIFICADORAS. FATOS NARRADOS NA DENÚNCIA QUE NÃO CONFIGURAM AS QUALIFICADORAS DO MOTIVO FÚTIL E DO EMPREGO DE MEIO CRUEL E DE RECURSO QUE IMPOSSIBILITOU A DEFESA DO OFENDIDO. RECURSO PARCIALMENTE PROVIDO PARA EXCLUIR DA PRONÚNCIA AS QUALIFICADORAS. - Não configurando os fatos narrados na denúncia as qualificadoras do motivo fútil, do emprego de meio cruel e de recurso que impossibilitou a defesa do ofendido, é de rigor sejam excluídas da pronúncia, devendo o réu ser submetido a julgamento pelo Tribunal do Júri tão-somente pela prática de crime de homicídio simples (art. 121, caput, do CP). - É de ser ressaltado que na espécie não se está afastando as qualificadoras em decorrência da ausência de provas, mas, sim, em virtude de os fatos narrados na denúncia não configurarem nenhuma das qualificadoras admitidas na pronúncia. 2) RECURSO EM SENTIDO ESTRITO. CRIME DE HOMICÍDIO. PEDIDO DE ABSOLVIÇÃO SUMÁRIA (ART. 411 DO CPP). ALEGAÇÃO DE SER O RÉU INIMPUTÁVEL E DE NÃO TER AGIDO COM DOLO. AUSÊNCIA DE PROVA ESTREME DE DÚVIDAS. COMPETÊNCIA DO TRIBUNAL DO JÚRI (ART. 5º, XXXVIII, "d", DA CF/88) PARA APRECIAR A MATÉRIA. INEXISTÊNCIA DE PROVA SEGURA. RECURSO DESPROVIDO. - Inexistindo prova segura das alegadas inimputabilidade e ausência de dolo, é de rigor que o acusado seja submetido a julgamento pelo Tribunal do Júri, juiz natural da causa. 3) RÉU PRESO EM FLAGRANTE. PEDIDO DE LIBERDADE PROVISÓRIA. INDEFERIMENTO POR SER NECESSÁRIA A CUSTÓDIA CAUTELAR COMO GARANTIA DA ORDEM PÚBLICA. - Ainda que se pudesse afastar a hipótese de prisão cautelar para assegurar a aplicação da lei penal, permaneceria, ainda, a da garantia da ordem pública, pois, o acusado, cometeu o suposto crime de homicídio que lhe é imputado, em alegado estado de embriaguez, o que bem evidencia que, se for colocado em liberdade, poderá novamente embriagar-se e cometer novas infrações penais. - Eventual tratamento médico de que necessite o recorrente, deverá ser solicitado ao magistrado em primeiro grau que, demonstrada sua necessidade, haverá de tomar as providências necessárias para que seja ministrado ao recorrente, independentemente do indeferimento de seu pedido de liberdade provisória.

(TJ/PR Acórdão 19232 Processo: 332727-9 Recurso em Sentido Estrito Comarca: Maringá Vara: 4ª Vara Criminal Natureza: Criminal Órgão Julg.: 1ª Câmara Criminal Relator: Desembargador Jesus Sarrão Dados da Publicação: DJ 7186 18/08/2006)

Processo: 0332727-9

RECURSO EM SENTIDO ESTRITO Nº. 332727-9, DE MARINGÁ - 4ª VARA CRIMINAL.

RECORRENTE: JOSUÉ DE ALENCAR SEVERIANO (RÉU PRESO).

RECORRIDO: MINISTÉRIO PÚBLICO DO ESTADO DO PARANÁ.

RELATOR: DES. JESUS SARRÃO.

1) RECURSO EM SENTIDO ESTRITO. RÉU PRONUNCIADO PELA PRÁTICA DE HOMICÍDIO TRIPLAMENTE QUALIFICADO (ART. 121, § 2º, II, III E IV, DO CÓDIGO PENAL). PEDIDO DE EXCLUSÃO DAS QUALIFICADORAS. FATOS NARRADOS NA DENÚNCIA QUE NÃO CONFIGURAM AS QUALIFICADORAS DO MOTIVO FÚTIL E DO EMPREGO DE MEIO CRUEL E DE RECURSO QUE IMPOSSIBILITOU A DEFESA DO OFENDIDO. RECURSO PARCIALMENTE PROVIDO PARA EXCLUIR DA PRONÚNCIA AS QUALIFICADORAS.

- Não configurando os fatos narrados na denúncia as qualificadoras do motivo fútil, do emprego de meio cruel e de recurso que impossibilitou a defesa do ofendido, é de rigor sejam excluídas da pronúncia, devendo o réu ser submetido a julgamento pelo Tribunal do Júri tão-somente pela prática de crime de homicídio simples (art. 121, caput, do CP).

- É de ser ressaltado que na espécie não se está afastando as qualificadoras em decorrência da ausência de provas, mas, sim, em virtude de os fatos narrados na denúncia não configurarem nenhuma das qualificadoras admitidas na pronúncia.

2) RECURSO EM SENTIDO ESTRITO. CRIME DE HOMICÍDIO. PEDIDO DE ABSOLVIÇÃO SUMÁRIA (ART. 411 DO CPP). ALEGAÇÃO DE SER O RÉU INIMPUTÁVEL E DE NÃO TER AGIDO COM DOLO. AUSÊNCIA DE PROVA ESTREME DE DÚVIDAS. COMPETÊNCIA DO TRIBUNAL DO JÚRI (ART. 5º, XXXVIII, "d", DA CF/88) PARA APRECIAR A MATÉRIA. INEXISTÊNCIA DE PROVA SEGURA. RECURSO DESPROVIDO.

- Inexistindo prova segura das alegadas inimputabilidade e ausência de dolo, é de rigor que o acusado seja submetido a julgamento pelo Tribunal do Júri, juiz natural da causa.

3) RÉU PRESO EM FLAGRANTE. PEDIDO DE LIBERDADE PROVISÓRIA. INDEFERIMENTO POR SER NECESSÁRIA A CUSTÓDIA CAUTELAR COMO GARANTIA DA ORDEM PÚBLICA.

- Ainda que se pudesse afastar a hipótese de prisão cautelar para assegurar a aplicação da lei penal, permaneceria, ainda, a da garantia da ordem pública, pois, o acusado, cometeu o suposto crime de homicídio que lhe é imputado, em alegado estado de embriaguez, o que bem evidencia que, se for colocado em liberdade, poderá novamente embriagar-se e cometer novas infrações penais.

- Eventual tratamento médico de que necessite o recorrente, deverá ser solicitado ao magistrado em primeiro grau que, demonstrada sua necessidade, haverá de tomar as providências necessárias para que seja ministrado ao recorrente, independentemente do indeferimento de seu pedido de liberdade provisória.

Vistos, relatados e discutidos estes autos de Recurso em Sentido Estrito nº. 332727-9, de Maringá - 4ª Vara Criminal, em que é recorrente Josué de Alencar Severiano (réu preso) e recorrido o Ministério Público do Estado do Paraná.

O órgão do Ministério Público, em exercício na 4ª Vara Criminal da Comarca de Maringá, ofereceu denúncia contra Josué de Alencar Severiano, por homicídio triplamente qualificado (art. 121, § 2º, II, III e IV, do Código Penal), estando a imputação descrita na denúncia nos seguintes termos, verbis:

"Consta dos inclusos autos de inquérito policial que no dia 17 de março de 2005, entre 20h30 e 21h20, no interior da residência, sito na rua Pioneiro Carlos Assalim, casa 01, Conj. Guararapes, Vila Nova, nesta cidade e comarca, o denunciado JOSUE DE ALENCAR SEVERIANO com vontade livre e consciente matou, de qualquer modo, a criança Wellington Ribeiro Severiano, seu filho, produzindo-lhe as lesões contundentes múltiplas em sua cabeça e tronco, descritas no laudo de exame de necropsia de fls. 20, e que lhe foram a causa eficiente de sua morte."

"Pela sede das múltiplas lesões e circunstâncias do evento, atestadas pela perícia complementar de f. 49, bem como pela pouca idade da criança, sem qualquer condição de reação ou defesa, eis que se tratava de um bebê de apenas 01 ano de idade, verifica-se que o denunciado JOSUE DE ALENCAR SEVERIANO agiu de modo cruel, impingindo na pequena e indefesa vítima excessivo e desnecessário sofrimento, sem o mínimo sentimento de compaixão, sem qualquer motivo justificável e de modo a impossibilitar a sua defesa."

O réu foi preso em flagrante delito em 18/05/2005 (fls. 07/10).

Recebida a denúncia em 13/09/2001 (f. 149), o acusado foi citado (f. 161/v) e interrogado (fls. 185/186) tendo sido apresentada defesa prévia (fls. 235/236) em 26/06/95, por intermédio de advogado constituído por ocasião de seu interrogatório, Dr. Israel Batista de Moura.

Na instrução criminal, foram ouvidas 06 (seis) testemunhas arroladas pelo Ministério Público (fls. 304/311), e 04 (quatro) testemunhas arroladas pela defesa (fls. 315/318).

Encerrado o sumário de culpa, o Ministério Público apresentou alegações finais (fls. 307/312), em 15/12/2005, pugnando pela pronúncia do acusado José de Alencar Severiano nos termos da denúncia, vez que estaria comprovada a materialidade e a autoria do homicídio, bem como, haveria indícios suficientes da configuração das qualificadoras (fls. 321/331).

Já a defesa, em suas alegações finais, apresentadas em 13/12/2005, requereu a absolvição sumária do réu, com a aplicação de medida de segurança, em decorrência de sua inimputabilidade ou, alternativamente, a pronúncia do réu por homicídio simples, com a exclusão das qualificadoras do motivo fútil, meio cruel e emprego de recurso que impossibilitou a defesa do ofendido. Requer, por fim, a revogação da sua prisão preventiva (fls. 332/351).

Na decisão de pronúncia, proferida em 16/12/2005, o Magistrado de primeiro grau considerou o réu incurso nas sanções do art. 121, § 2º II, III e IV, do Código Penal, por entender comprovada a materialidade do crime e haver indícios suficientes de autoria. No tocante às qualificadoras, do motivo fútil, meio cruel e emprego de recurso que impossibilitou a defesa do ofendido, entendeu o Magistrado que elas devem ser submetidas a apreciação dos jurados (f. 359). Por fim, o Magistrado negou o pedido de revogação da prisão cautelar por entender ainda estarem presentes os requisitos da prisão preventiva.

À f. 363/v o réu foi intimado pessoalmente da decisão de pronúncia (art. 414, do CPP).

Inconformado com a decisão, o réu interpôs, em 13/01/06, o presente recurso em sentido estrito (f. 365), requerendo, em suas razões de recurso (fls. 367/382): a) a declaração de nulidade da decisão em por ausência de fundamentação (f. 368/369); b) a exclusão das três qualificadoras - motivo fútil, meio cruel e recurso que impossibilitou a defesa da vítima; c) sua absolvição por ser réu inimputável (f. 372), bem como por não ter o réu agido com dolo; e d) a revogação de sua prisão preventiva.

O recurso foi contra-arrazoado, em 09/02/2006, pelo órgão do Ministério Público que se manifestou pela manutenção da pronúncia (fls. 384/388).

Na fase do art. 589 do Código de Processo Penal, a Magistrada de primeiro grau manteve a decisão de pronúncia (f. 389).

A douta Procuradoria-Geral de Justiça, em parecer subscrito pelo ilustre Procurador de Justiça, Dr. Francisco José Albuquerque de S. Branco, opinou pelo desprovimento do recurso (fls. 399/405).

É o relatório.

Voto.

a) Nulidade da decisão de pronúncia por ausência de fundamentação.

Alega o recorrente ser nula a decisão de pronúncia por ausência de fundamentação, pois o Magistrado não teria indicado os fundamentos que o levaram "a rejeitar as alegações formuladas pela defesa, que no caso foram as de legítima defesa, estrito cumprimento do dever legal e exclusão das qualificadoras" (f. 369).

Da leitura das alegações finais apresentadas pelo réu (fls. 321/331) observa-se que não foram sustentadas as teses de "legítima defesa e estrito cumprimento do dever legal", até porque seriam manifestamente incompatíveis com a espécie examinada. Assim, não teria como o Magistrado ter apreciado tais teses e, conseqüentemente, não há que se falar em ausência de fundamentação em relação a questões não argüidas pela defesa.

b) Qualificadoras do motivo fútil, emprego de meio cruel e de recurso que impossibilitou a defesa da vítima.

O Magistrado no tocante as qualificadoras do motivo fútil, do emprego de meio cruel, e recurso que impossibilitou a defesa do ofendido, tão-somente mencionou que tais qualificadoras devem ser "apreciadas pelos jurados" (f. 359).

Na espécie, porém, não se trata de ausência de fundamentação das qualificadoras, pois o Magistrado não teria como fundamentá-las em decorrência de os fatos narrados na denúncia não configurarem as qualificadoras do motivo torpe, do emprego de meio cruel, e recurso que impossibilitou a defesa do ofendido.

A qualificadora do motivo fútil descrita na denúncia estaria configurada, no entender da digna Promotora de Justiça que a subscreveu, pelo fato de o réu ter matado seu filho "sem qualquer motivo justificável". Já nas alegações finais o órgão do Ministério Público alegou que "a ausência de motivo configura o aumento da reprovabilidade da conduta".

Certamente a ausência de motivo para a prática do crime de homicídio demonstra a maior censurabilidade do crime praticado, o que deve ser apreciado no momento da dosimetria da pena-base na circunstância judicial da culpabilidade (art. 59, do CP), porém, a ausência de motivo para o homicídio, obviamente, não configura a qualificadora do motivo fútil (art. 121, § 2, I do CP), não cabendo o uso da analogia para colmatar a lacuna legislativa, decorrente da falta de previsão da ausência de motivo como qualificadora do crime de homicídio, pois a norma penal exige precisão em seus termos para garantia dos cidadãos, em respeito ao princípio da estrita legalidade em matéria penal.

Sobre o tema é oportuno citar a lição doutrinária de Cezar Roberto Bitencourt e Luis Regis Prado,

"... motivo fútil não se confunde com ausência de motivos. Esta é uma grande aberração jurídico-penal. A presença de um motivo, fútil ou banal, qualifica o homicídio. No entanto, a completa ausência de motivo, que deve tornar mais censurável a conduta, pela gratuidade e maior reprovabilidade, não o qualifica. Absurdo lógico: homicídio motivado é qualificado; homicídio sem motivo é simples. Por isso, defendemos, de lege ferenda, o acréscimo de uma nova qualificadora ao homicídio: "ausência de motivos",."

(Código Penal Anotado" Revista dos Tribunais, 2ª edição, 1999, pág.450)

No mesmo sentido é a lição do professor Damásio de Jesus, verbis:

"O motivo fútil não se confunde com a ausência de motivo. Assim, se o sujeito pratica o fato sem razão alguma, não incide essa qualificadora..."

(in "Direito Penal" 2º Vol. Saraiva, 17ª edição, 1995, pág. 58).

No egrégio Superior Tribunal de Justiça, em suas duas Turmas de Direito Público, Quinta e Sexta Turmas, também é assente tal entendimento, verbis:

"PENAL E PROCESSO PENAL. RECURSO ESPECIAL. HOMICÍDIO FÚTIL. AUSÊNCIA DE MOTIVO EXCLUSÃO DA QUALIFICADORA.

I - A qualificadora do homicídio para ser admitida na pronúncia exige a existência de indícios e sobre eles, sucintamente, deve manifestar-se o Magistrado.

II - A não identificação de motivo não pode ser reconhecida - mesmo no iudicium accusationis - como motivo fútil. Recurso desprovido."

(STJ - Resp 327133/PR, 5ª T., Rel. Ministro Felix Fischer, DJU 08/10/2001, P. 247).

"2. Não se revelando nos autos o motivo do crime, não há falar seja ele fútil, até porque não há como valorar uma conduta, reputando-a fútil, ou não, se não se sabe o motivo que lhe deu causa. (STJ - Resp 172163/DF, 6ª T., Rel. Ministro Hamilton Carvalhido, DJU 27/08/2001, P. 418)

Já qualificadora do emprego de recurso que impossibilitou a defesa do ofendido estaria configurada, conforme descrição da denúncia, em face da "pouca idade da criança, sem qualquer condição de reação ou defesa, eis que se tratava de um bebê de apenas um ano de idade" (f. 03).

Como se observa dos fatos descritos na denúncia, que configurariam a qualificadora em análise, não há descrição de nenhum fato demonstrativo de que o réu agiu com o intuito, elemento subjetivo diverso do dolo, de dificultar ou impossibilitar a defesa da vítima, exigido para a caracterização do tipo derivado previsto no art. 121, § 2º, IV, do Código Penal.

Nesse sentido é a lição de Guilherme de Souza Nucci que ensina que para a configuração do recurso que impossibilitou ou dificultou a defesa do ofendido, "É indispensável a prova de que o agente teve por propósito efetivamente surpreender a pessoa visada, enganando-a, impedindo-a de se defender ou, ao menos, dificultando-lhe a reação". É indispensável o elemento subjetivo específico, ou, na visão tradicional, do dolo específico." (in "Código Penal Comentado", Revista dos Tribunais, 2002, 2ª ed., pág. 377).

Com devida vênia, a circunstância de a vítima ser uma criança com um ano de idade, por si só, não configura a qualificadora do emprego de "recurso que dificulte ou torne impossível a defesa do ofendido" (art. 121, § 2º, IV, do CP), pois tal qualificadora trata de emprego de "recurso", ou seja, meio, expediente, utilizado pelo réu, semelhantes, por interpretação analógica, "à traição, emboscada, ou dissimulação", para dificultar ou impossibilitar a defesa da vítima. Ora, o fato de a vítima ser uma criança, certamente, não configura um "recurso", supostamente, utilizado pelo réu para o cometimento do homicídio, mas sim circunstância pessoal da vítima.

Por outro lado, não se pode olvidar que o art. 121, § 4º, do Código Penal prevê expressamente a majorante de 1/3 (um terço) da pena no caso de o homicídio ser praticado "contra pessoa menor de 14 (quatorze) anos". Se o homicídio cometido contra criança configurasse, por si só, a qualificadora prevista no inciso IV, do § 2º, do art. 121, IV, do CP, haveria um bis in idem instituído legalmente.

Por último, a qualificadora do emprego de meio cruel descrita na denúncia estaria configurada, no entender da digna Promotora de Justiça que a formulou, pelo fato de o réu ter matado "de qualquer modo" seu filho "impingindo na pequena e indefesa vítima excessivo e desnecessário sofrimento". Já na fase das alegações finais o órgão do Ministério Público alegou que a qualificadora do emprego de meio cruel estaria configurada "pois o réu atuou com malvadez, revelando acima de tudo insensibilidade moral sem qualquer sentimento de piedade" (f. 327).

A descrição feita na denúncia de que o réu teria matado seu filho "de qualquer modo" "impingindo na pequena e indefesa vítima excessivo e desnecessário sofrimento", certamente é inidônea para configuração da qualificadora da utilização do "meio cruel" (art. 121, § 2º, III, do CP).

Segundo Jullio Fabrbini Mirabette "a utilização de meio cruel, que sujeita a vítima a graves e inúteis sofrimentos físicos ou morais, meio bárbaro, brutal, que aumenta inutilmente o sofrimento da vítima. A reiteração de golpes, por si mesma, não qualifica o crime, mas o faz quando denúncia a crueldade do agente e o sofrimento desnecessário da vítima." (in "Código Penal Interpretado", 5ª edição, São Paulo, Atlas, pág. 926).

Para caracterização da qualificadora do uso de "meio cruel" é imprescindível que se descreva o meio, ou seja, o modo de agir, a forma utilizada para o cometimento do homicídio, análogo ao "fogo, asfixia, tortura", é necessário que se demonstre em que consistiu o "meio cruel" utilizado pelo réu.

A simples descrição feita na denúncia de que o réu teria matado a vítima "de qualquer modo" já demonstra, a toda evidência, que não há na denúncia a descrição de fato que pudesse configurar a qualificadora do meio cruel e, conseqüentemente, não pode permanecer na pronúncia a qualificadora do emprego de meio cruel.

A simples alusão à "sede das múltiplas lesões" sofridas pela vítima não pode ensejar a qualificadora da utilização de "meio cruel" se não há descrição de como foram causadas as lesões.

Embora o médico que examinou as lesões sofridas pelo criança tenha afirmado, em seu depoimento prestado em juízo, que algumas lesões sofridas pela vítima poderiam ter sido ocasionadas pela batida "da criança em uma quina" (f. 305), tal suposição, ainda que fosse descrita na denúncia, não configuraria, por si só, a qualificadora do meio cruel.

Desse modo, não configurando os fatos narrados na denúncia nenhuma das qualificadoras do crime de homicídio, o afastamento das qualificadoras do motivo fútil, do emprego de meio cruel e de recurso que impossibilitou a defesa do ofendido, é medida que se impõe, devendo o réu ser submetido a julgamento pelo Tribunal do Júri tão-somente pela prática de crime de homicídio simples (art. 121, caput, do CP).

É de ser ressaltado que na espécie não se está afastando as qualificadoras em decorrência da ausência de provas, mas, sim, em virtude de os fatos narrados na denúncia não configurarem nenhuma das qualificadoras admitidas na pronúncia.

c) Pedido de absolvição sumária por ser o acusado inimputável (f. 372) e por não ter agido com dolo f. 374.

O recorrente, alegando inimputabilidade, com base no exame de insanidade mental, requer sua absolvição.

Os psiquiatras que realizaram o exame de insanidade mental do réu constataram que ele não era inteiramente incapaz de entender o caráter ilícito de sua conduta conforme se observa da resposta ao quesito 3º, verbis:

"É preciso ressaltar que o fato de o indivíduo estar, à época da ação, sob efeito de etílicos, não diminui, per se, a imputabilidade penal, uma vez que, se não era bebedor por dependência, que precisa beber devido à compulsão física, doença, deveria saber quais as conseqüências do uso de álcool antes de começar a beber."

Da mesma forma, os psiquiatras concluíram na resposta ao quesito número 05 que o réu "ao tempo dos fatos era parcialmente capaz de determinar-se de acordo com o entendimento dos fatos" (f. 213).

Como se observa da conclusão dos médicos não está devidamente comprovado que o réu é inimputável, não cabendo, assim, sua absolvição sumária nos termos do art. 411 do Código de Processo Penal. Se é caso ou não de incidência da causa de redução de pena, prevista no parágrafo único, do art. 26 do Código Penal, é questão que deve ser submetida à deliberação do Conselho de Sentença.

O recorrente alega, ainda, que, estando totalmente embriagado à época em que ocorreu o fato narrado na denúncia, não teria agido com dolo ao supostamente matar seu filho.

Caso o Tribunal do Júri entenda que o réu estava embriagado no momento do fato de forma a encontrar-se inteiramente incapaz de entender o caráter ilícito do fato ou de determinar-se de acordo com esse entendimento, ou seja, encontrar-se em estado de incapacidade de culpabilidade, terá de analisar as "... hipóteses formuláveis a respeito do indivíduo que comete crime em estado de embriaguez", que o professor Francisco de Assis Toledo, citando Nelson Hungria, aponta serem as seguintes, verbis::

"a) embriagou-se voluntariamente com o fim concebido de cometer o crime; b) embriagou-se voluntariamente, sem o fim de cometer o crime, mas prevendo que em tal estado podia vir a cometê-lo e assumindo o risco de tal resultado; c) embriagou-se voluntariamente ou imprudentemente, sem prever, mas devendo prever, ou prevendo, mas esperando que não ocorresse a eventualidade de vir a cometer o crime; d) embriagou-se por caso fortuito ou força maior (sem intenção de se embriagar e não podendo prever os efeitos da bebida) ..."

Analisando tais hipóteses decorrentes da embriaguez o professor Francisco de Assis Toledo, conclui que, verbis:

"Para nós, somente os casos sob a e b se resolvem pela actio libera in causa. Na hipótese sob c só se poderá cogitar, segundo supomos, de um crime culposo e se houver previsão legal, para o que, aliás, dispensável será recorrer-se a outros princípios que não os da culpa estricto sensu, já estudados, os quais oferecem solução adequada. Considerar-se o crime doloso, nessa hipótese, "segundo a direção ou atitude da residual vontade que existe no estado de ebriedade", constitui, ao nosso ver, uma conjugação de culpa e dolo (...). Corretas, pois, se nos afiguram estas afirmações a respeito do tema, de E. R. Zaffaroni: "Si el dolo es el fin de cometer un delito determinado, o sea el querer la realización de un tipo objetivo, nada tiene que ver esta voluntad con la de incapacitarse, salvo cuando el sujeto se incapacita con el fin de cometer ele delito, en cuyo caso es un instigador de sí mismo (autor mediato). Este es el supuesto de la llamada 'acción libre en su causa'; que consiste en encuadrar típicamente la totalidad de la conducta y no sólo la mera parte lesiva de la acción. Si en la conducta dolosa el sujeto prevé la causalidad y la programa, por ende, nada se altera en el dolo cunado él mismo como agente físico o como autor inculpable, entra a formar parte de esa programación para la realización del fin típico. En tal supuesto nos hallaremos con una clara conducta típica dolosa, con dolo directo. Igualmente, si previó e incluyó en la finalidad la producción del resultado típico durante la incapacidad provocada, también habrá una conducta típica dolosa con dolo eventual. Si, en lugar, no se incapacitó, con el fin de realizar un tipo objetivo, sino que lo hizo con cualquier otra finalidad, pero le fue previsible su realización y en las condiciones en que se incapacitó su conducta (de incapacitarse) era violatoria de un deber de cuidado, tendremos una típica conducta culposa (siempre que exista el correspondiente tipo culposo) cualquier desconocimiento a estos principios implica una intromisión de la responsabilidad objetiva. Tal sucede cuando: a) Se considera autor doloso de una conducta que en situación de incapacidad el sujeto no quiso realizar, porque se toma como típico el dolo que el sujeto tuvo durante la incapacidad (lo que es correcto), pero se le reprocha en base a la totalidad de la conducta, es decir, que a los efectos de la tipicidad se toma una conducta y a los de la culpabilidad otra. No puede haber una más clara aplicación del principio 'quien quiso la causa quiso el efecto'. b) se considera a un sujeto autor culposo de una conducta que en estado de capacidad no pudo prever. Aquí se va a la responsabilidad objetiva con toda claridad: hay culpa sin previsibilidad del resultado, tipicidad culposa sin tipo subjetivo (conocimiento potencial) culposo. Cualquiera de ambas soluciones es una clara aplicación del versare in re illicita, cuya vigencia no se ha perdido un sector de nuestra jurisprudencia, pese al general repudio doctrinario".

(in "Princípios básicos de Direito Penal" editora Saraiva, 5ª edição, 1994, pág. 324/326)

No mesmo sentido, é a lição do professor Juarez Cirino dos Santos, verbis:

"O conceito de actio libera in causa não encontra dificuldade em relação aos fatos imprudentes, pela existência de identidade estrutural ente ambos: a lesão do cuidado objetivo ou do risco permitido na imprudência é, sempre, anterior em relação à produção do resultado típico. Por exemplo: se o marido, encolerizado contra a mulher, embriaga-se e a agride, mas sem ter pensado previamente em agredir a mulher em estado de incapacidade de culpabilidade, então o ato de embriagar-se representaria simples criação de risco não permitido contra integridade física da mulher, e a agressão à mulher seria a realização do risco criado, caracterizando o tipo de lesão corporal imprudente. Aqui é necessário um esclarecimento de maior significação prática: se o autor, na ação precedente, não tem o propósito (dolo direto) ou não admite a possibilidade (dolo eventual) de realizar determinado tipo de crime em estado de incapacidade de culpabilidade, então o resultado típico produzido na ação posterior não pode ser atribuído por dolo, independentemente de ser intencional (o sujeito quer se embriagar) ou imprudentemente (o sujeito se embriaga, progressiva mas inadvertidamente) o ato de se embriagar. Por isso, o princípio da culpabilidade determina a seguinte interpretação do art. 28, II, do Código Penal: a embriaguez, voluntária ou culposa, não exclui a imputabilidade penal, mas a imputação do resultado por dolo ou por imprudência depende, necessariamente, da existência real (nunca presumida) dos elementos do tipo subjetivo respectivo no comportamento do autor."

(in "A moderna teoria do fato punível", editar Revan, 2ª edição, 2002, pág. 191/192)

A questão, a saber, em qual das hipóteses de embriaguez o réu supostamente praticou o crime, ou seja, se ele agiu com dolo direto (hipótese "a"), eventual (hipótese "b") ou culpa (hipótese "c"), cabe ao Tribunal do Júri, juiz natural para julgar os crimes dolosos contra a vida (art. 5º, XXXVIII, "d", da CF/88), decidir, no exercício de sua soberania, em qual dessas hipóteses se ajusta a conduta do acusado, caso, evidentemente, a matéria seja objeto de sustentação pela defesa na sessão de julgamento.

d) Pedido de revogação da prisão cautelar.

O réu foi preso em flagrante delito em 18/05/2005 (fls. 07/10) e permanece preso até a presente data. A defesa, em suas alegações finais, requereu a revogação da prisão cautelar do ora recorrente e sua internação no Hospital Psiquiátrico de Maringá para tratamento médico (fls. 345/351), tendo a Magistrada, ao proferir a decisão de pronúncia, indeferido o pedido pelos seguintes fundamentos, verbis:

"... deve-se observar que o pedido de revogação da prisão cautelar do acusado, pleiteado e formulado pelo seu Defensor em sede de alegações do art. 406 do Código de Processo Penal e conseqüente pedido de submissão a tratamento médico urgente, resta indeferido, eis que presentes se encontram os requisitos ensejadores da decretação da custódia cautelar, dentre eles, os da garantia da ordem pública, bem como para que se possa assegurar a aplicação da Lei Penal, diante do clamor público, de repercussão dos fatos e da possibilidade de evasão do distrito da culpa, não havendo que se falar, por outro lado, em concessão de liberdade em quaisquer de suas modalidades." (f. 359).

Ainda que se pudesse afastar a hipótese de prisão cautelar para assegurar a aplicação da lei penal, permaneceria, ainda, a da garantia da ordem pública, pois, o acusado, cometeu o suposto crime de homicídio que lhe é imputado, em alegado estado de embriaguez, o que bem evidencia que, se for colocado em liberdade, poderá novamente embriagar-se e cometer novas infrações penais.

Quanto a eventual tratamento médico de que necessite o recorrente, deverá ser solicitado ao magistrado em primeiro grau que, demonstrada a necessidade, haverá de providenciá-lo, independentemente de ser deferida liberdade provisória ao recorrente, que foi preso em flagrante.

Diante do exposto, ACORDAM os Desembargadores da Primeira Câmara Criminal do Tribunal de Justiça do Estado do Paraná, por unanimidade de votos, em dar parcial provimento ao presente recurso em sentido estrito para excluir da pronúncia as qualificadoras do motivo fútil, do emprego de meio cruel e de recurso que impossibilitou defesa do ofendido, ficando o réu pronunciado como incurso no art. 121, caput, do Código Penal.

Participaram do julgamento, votando com o relator, os senhores Desembargadores Campos Marques e Oto Luiz Sponholz (Presidente).

Curitiba, 03 de agosto de 2005.

Des. Jesus Sarrão

Relator

Superior Tribunal de Justiça

HABEAS CORPUS Nº 30.137 - SP (2003/0155603-1)

RELATOR : MINISTRO FELIX FISCHER

IMPETRANTE : EDUARDO GALIL E OUTRO

IMPETRADO : QUARTA CÂMARA CRIMINAL DO TRIBUNAL DE JUSTIÇA

DO ESTADO DE SÃO PAULO

PACIENTE : EMILIE DAUD SARRUF (PRESA)

EMENTA

PROCESSUAL PENAL. HABEAS CORPUS. DENÚNCIA. INÉPCIA.

QUALIFICADORAS. DESCRIÇÃO INSUFICIENTE. INOCORRÊNCIA. SUPORTE FÁTICO. EXISTÊNCIA. VERIFICAÇÃO. IMPOSSIBILIDADE.

I - As qualificadoras incluídas (motivo torpe e diminuição da resistência da vítima) foram devidamente descritas na denúncia, não havendo falar em inépcia.

II - A via estreita do habeas corpus, que não comporta dilação probatória, não se presta à aferição, in casu, da existência de suporte fático suficiente para inclusão das qualificadoras descritas na denúncia.

Ordem denegada.

(STJ Processo HC 30137/SP HABEAS CORPUS 2003/0155603-1 Relator(a) Ministro FELIX FISCHER (1109) Órgão Julgador T5 - QUINTA TURMA Data do Julgamento 18/11/2003 Data da Publicação/Fonte DJ 15.12.2003 p. 339)

ACÓRDÃO

Vistos, relatados e discutidos os autos em que são partes as acima indicadas, acordam os Ministros da QUINTA TURMA do Superior Tribunal de Justiça, por unanimidade, denegar a ordem. Os Srs. Ministros Gilson Dipp, Jorge Scartezzini, Laurita Vaz e José Arnaldo da Fonseca votaram com o Sr. Ministro Relator.

Brasília (DF), 18 de novembro de 2003 (data do julgamento)

MINISTRO FELIX FISCHER

Relator

Superior Tribunal de Justiça

HABEAS CORPUS Nº 30.137 - SP (2003/0155603-1)

RELATÓRIO

O EXMO. SR. MINISTRO FELIX FISCHER: Trata-se de habeas corpus substitutivo de recurso ordinário impetrado em favor de Emilie Daud Sarruf, denunciada pela suposta prática do delito capitulado no art. 121, § 2º, incisos I e IV, do Código Penal, o qual dirige-se outra o acórdão prolatado pela e. Quarta Câmara Criminal do Tribunal de Justiça do Estado de São Paulo no julgamento do HC n.º 420.156.3/5.

Sustentam as razões do writ a inépcia da inicial, porquanto as qualificadoras não foram adequadamente descritas. Diz que não restaram demonstradas, satisfatoriamente, a existência de motivo torpe e a dificuldade de reação da vítima.

Assevera que, sendo sua cônjuge-meeira, seria descabido o argumento de que objetivava apropriar-se dos bens do de cujus, o que afastaria a base utilizada para inclusão na denúncia da qualificadora "motivo torpe". Alega, ainda, não estar devidamente comprovado que a vítima não teve sua resistência diminuída, o que rechaçaria a outra qualificadora apontada.

Denegada a liminar à fl. 63.

A autoridade coatora prestou informações (fls. 87/103).

A douta Subprocuradoria-Geral da República opina pela denegação da ordem.

ABEAS CORPUS Nº 30.137 - SP (2003/0155603-1)

EMENTA

PROCESSUAL PENAL. HABEAS CORPUS.DENÚNCIA. INÉPCIA.QUALIFICADORAS.DESCRIÇÃO INSUFICIENTE. INOCORRÊNCIA.SUPORTE FÁTICO. EXISTÊNCIA. VERIFICAÇÃO.IMPOSSIBILIDADE.

I - As qualificadoras incluídas (motivo torpe e diminuição da resistência da vítima) foram devidamente descritas na denúncia, não havendo falar em inépcia.

II - A via estreita do habeas corpus, que não comporta dilação probatória, não se presta à aferição, in casu, da existência de suporte fático suficiente para inclusão das qualificadoras descritas na denúncia.

Ordem denegada.

VOTO

O EXMO. SR. MINISTRO FELIX FISCHER: Não há qualquer reparo a ser feito no entendimento exarado pelo e. Tribunal a quo quando do julgamento do habeas corpus, objeto de ataque do presente writ. A propósito, transcrevo excerto do voto proferido na ocasião, verbis:

"Muito embora a denúncia não seja modelar, seja sucinta e parcimoniosa, não se estendendo, em abundância, na descrição dos fatos, ela não é inepta, pois contém os elementos essenciais do tipo penal, possibilitando à paciente o exercício de seu direito de ampla defesa.

Consoante se pode verificar pela denúncia, reproduzida às fls. 38/39, a paciente está sendo acusada como incursa no artigo 121, § 2º, incisos I e IV, do Código Penal, porque teria matado, mediante disparo de arma de fogo, seu marido Sérgio Afif Sarruf, agindo por motivo torpe e utilizando-se de recurso que teria impossibititado a defesa do ofendido.

A descrição do fato principal, relativa ao homicídio, que consiste em matar alguém, esta feita no primeiro parágrafo da denúncia, quando diz que a paciente matou Sérgio Afif Sarruf, mediante disparos de arma de fogo. A narração do fato principal está repetida no terceiro tópico, quando menciona: "Já, na data dos fatos, a denunciada após a premeditação do crime na semana anterior, enquanto dois filhos do casal encontravam-se dormindo, armou-se e foi ao encontro da vítima, matando-a com disparo de arma de fogo" (textual - fls. 38).

A qualificadora do motivo torpe, por sua vez, está descrita no quarto parágrafo da exordial, nos seguintes termos:

"A violência se deu por motivo torpe, consistente no abjeto sentido de se apoderar dos valores e patrimônio da vítima, uma vez que vinha enfrentando sérias dificuldades financeiras e via na morte de seu marido a solução para estes problemas" (fls. 38).

A qualificadora do emprego de recurso que impossibilitou a defesa do ofendido, por fim, vem descrita no quinto parágrafo da peça inaugural, com o seguinte teor:

"O crime se consumou com recurso que impossibilitou a defesa da vítima, porquanto o ofendido encontrava-se em estado de recuperação da intoxicação anterior, além de não esperar tal atitude da denunciado, sua esposa, sendo, pois, surpreendido de inopino, no quarto onde o casal dormia".

Como se vê, há descrição do fato principal e de circunstâncias constitutivas das qualificadoras, embora estas tenham sido expostas de modo conciso, condensado.

Não havia necessidade de o Ministério Público se estender na descrição dos valores e patrimônio, dos quais, segundo a denúncia, a paciente pretenderia se apoderar.

Trata-se de questão que deverá ser apurada na instrução.

Como esposa e companheira da vítima, a paciente, evidentemente, tem conhecimento do patrimônio do marido. Verifica-se que a própria impetração foi instruída com xerocópia das Primeiras Declarações do Inventário do Espólio da vítima, nas quais estão descritos os bens e valores que constituíam o patrimônio do ofendido.Não se pode ver, na descrição da qualificadora do motivo torpe, efetuada na denúncia, a configuração de um crime de latrocínio, como foi dito na impetração. Este consiste na subtração de bens, mediante violência, da qual resulte o evento morte (art. 157, § 3º, segunda parte, do C.P.). Percebe-se que não é esse o sentido dado pela narração da qualificadora em referência, na qual se quis dizer que, com a morte da vítima, bens e valores dela passariam para a paciente, que, com eles, solucionaria as dificuldades financeiras que enfrentava.

Se os fatos constitutivos da qualificadora em foco são ou não verdadeiros e se a paciente, como meeira, em tese, não precisaria cometer o homicídio para ficar com bens da vítima, são questões atinentes ao mérito da ação penal, demandando a sua análise exame aprofundado de provas, não podendo, por isso, ser discutidas e decididas nos

limites estreitos do "habeas corpus"" (fls. 52/54).

Com efeito, a exordial acusatória, embora parcimoniosa, preenche os requisitos do art. 41 do CPP, não gerando qualquer prejuízo ao exercício do direito de defesa do acusado. O fato criminoso foi descrito, com as suas respectivas circunstâncias, a qualificação da acusada, a classificação do ilícito penal e o rol das testemunhas. Colho, por sinal, alguns precedentes que corroboram essa orientação:

"PROCESSUAL PENAL. HABEAS CORPUS SUBSTITUTIVO. DUPLO HOMICÍDIO QUALIFICADO. DENÚNCIA. ADITAMENTO. INÉPCIA. AÇÃO PENAL. JUSTA CAUSA. PRISÃO CAUTELAR. FUNDAMENTOS. CITAÇÃO POR EDITAL. REGULARIDADE.

I Denúncia que apresenta narrativa que se ajusta ao modelo da conduta proibida não é, em princípio, inepta porquanto permite a ampla defesa.

II - Em sede de habeas corpus , a tese da falta de justa causa deve ser passível de imediata verificação sem recurso ao vedado minucioso cotejo analítico das provas.

III - Se a segregação cautelar, preenchendo os requisitos legais, apresenta convincente fundamentação concreta, não há que se falar em constrangimento ilegal.

IV Regularidade da citação editalícia do paciente que, após a prática do crime, empreendeu fuga, sendo encontrado somente seis anos depois em longínqua cidade, fazendo uso de falsa identidade.

Ordem denegada."

(HC 23.391/BA, 5ª Turma, de minha relatoria, DJU de 16/12/2002).

"PROCESSUAL PENAL. HABEAS CORPUS SUBSTITUTIVO DE RECURSO ORDINÁRIO. CRIME CONTRA O MEIO AMBIENTE.

I - Se a imputação é clara e específica, permitindo a adequação típica e, simultaneamente, a ampla defesa, não há que se reconhecer a pretendida inépcia da exordial acusatória.

II - Se a verificação do suporte fático-probatório da denúncia, em termos de justa causa, exige o exame aprofundado do material cognitivo, a pretensão inserida na proemial do writ escapa dos limites próprios da via eleita.

Habeas Corpus indeferido."

(HC 18.339/SP, 5ª Turma, de minha relatoria, DJU de 19/12/2002).

Outrossim, a via estreita do habeas corpus, que não comporta dilação probatória, não se presta à aferição da existência de suporte fático suficiente para inclusão das qualificadoras descritas na denúncia. E a pretensão insculpida na inicial do writ, para ser

acolhida, exigiria uma incursão impertinente no material congnitivo. A esse respeito, confira-se o seguinte precedente, verbis:

"PENAL. PRONÚNCIA. QUALIFICADORAS. AFASTAMENTO. DILAÇÃO PROBATÓRIA. IMPOSSIBILIDADE.

1 - O habeas corpus não é meio adequado para a discussão e decisão sobre a existência ou não de qualificadoras, articuladas na denúncia e acolhidas pela sentença de pronúncia, por reclamar semelhante intento investigação probatória. De mais a mais, a questão, em princípio, deve ser apreciada e solucionada pelo Tribunal do Júri.

2 - Ordem denegada."

(HC 15.979/MG, 6ª Turma, Rel. Min. Fernando Gonçalves, DJU de 01/10/2001).

Pelo exposto, denego a ordem.

É o voto.

O que é a qualificadora de meio cruel?

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O que é homicídio qualificado por meio cruel?

121, § 2º, inc. III, o homicídio é qualificado quando cometido com emprego de veneno, fogo, explosivo, asfixia, tortura ou outro meio insidioso (dissimulado) ou cruel (aumenta inutilmente o sofrimento da vítima), ou de que possa resultar perigo comum (capaz de atingir número indeterminado de pessoas).

O que caracteriza o meio cruel?

Meio cruel (fogo, explosivo, tortura) é aquele que causa, desnecessariamente, maior sofrimento à vítima, 'ou revela uma brutalidade fora do comum ou em contraste com o mais elementar sentimento de piedade' (Exposição de Motivos do Código Penal de 1940, n. 38).

Quais os tipos de qualificadoras?

As circunstâncias qualificadoras do crime apresentam-se, também, sob duas espécies: a) objetivas e b) subjetivas. São objetivas o meio e o modo de execução (veneno, fogo, explosivo etc.)

Quais as qualificadoras do crime de tortura?

b) para provocar ação ou omissão de natureza criminosa; c) em razão de discriminação racial ou religiosa; II - submeter alguém, sob sua guarda, poder ou autoridade, com emprego de violência ou grave ameaça, a intenso sofrimento físico ou mental, como forma de aplicar castigo pessoal ou medida de caráter preventivo.