Onde estão e quais são as pessoas que consomem o Iphone?

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Como um governo pode apresentar soluções para os problemas reais dos brasileiros se o seu ministro da Economia demonstra, dia após dia, que vive uma realidade paralela?

"Tem mais iPhones no Brasil do que população", foi a última declaração de Paulo Guedes, empolgado em provar que o Brasil é uma nação de "profundidade digital", nesta sexta (11).

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Dados da Anatel (Agência Nacional de Telecomunicacões) apontam que tivemos 255,7 milhões de linhas acessando as redes das operadoras por aqui em janeiro deste ano. Projeção do IBGE aponta que o Brasil tem, neste momento, cerca de 214,3 milhões de habitantes.

Mas do total de celulares operando em janeiro, apenas 14% usavam o iOS, o sistema operacional da Apple, de acordo com o agregador de dados Statcounter. Enquanto isso, quase 86% adotavam o Android - os demais sistemas são estatisticamente irrelevantes.

Na hipótese mais benevolente, o ministro confundiu "celular" com "smartphone da Apple", um produto mais caro - no Brasil, o aparelho topo de linha custa R$ 14.972,00. Uma confusão comum para quem acha que o país se resume à Faria Lima e empregadas domésticas viajam demais à Disney.

Isso sem contar que a "profundidade digital" do ministro deixa os usuários de internet em um apagão todos os meses.

De acordo com a Anatel, em janeiro, 46,6% das linhas eram de contas pré-pagas - que, em sua grande maioria, são utilizadas pela população mais pobre e a classe média baixa. Pesquisa de 2021 do Instituto de Defesa do Consumidor (Idec) e do Instituto Locomotiva aponta que os planos de dados dos mais vulneráveis duram apenas 19 dias em cada mês.

O Brasil de Paulo Guedes fica em um universo da Marvel que parece a Faria Lima

Afirmar que o Brasil tem mais iPhones do que cidadãos é apenas mais um capítulo do rosário de declarações de Paulo Guedes que comprovam que a realidade em que ele vive fica em uma outra dimensão. Há uma profusão de provas disso.

Em 25 de agosto do ano passado, ele perguntou "qual o problema agora que a energia vai ficar um pouco mais cara porque choveu menos?", ignorando que muitos têm que escolher entre comer ou ficar no escuro. Detalhe: o governo culpou a falta de chuva, mas o caos foi consequência das falhas na gestão dos reservatórios de usinas do sistema elétrico nacional por parte do governo.

Em 27 de abril de 2021, Guedes reclamou, em reunião do Conselho de Saúde Suplementar, que o aumento da expectativa de vida dos brasileiros dificultava que o governo fechasse as contas. "Todo mundo quer viver 100 anos, 120, 130. Não há capacidade de investimento para que o estado consiga acompanhar."

Em declaração à revista Veja, publicada em 13 de março de 2020, disse que bastariam R$ 5 bilhões para acabar com o coronavírus. "Com 3 bilhões, 4 bilhões ou 5 bilhões de reais a gente aniquila o coronavírus. Porque já existe bastante verba na Saúde, o que precisaríamos seria de um extra." De acordo com o site de transparência do Tesouro Nacional, o governo federal gastou R$ 524 bilhões, somente em 2020.

Em 12 de fevereiro de 2020, durante um evento, ele reclamou que trabalhadoras empregadas domésticas estavam indo à Disney. "O câmbio não está nervoso, [o câmbio] mudou. Não tem negócio de câmbio a R$ 1,80. Todo mundo indo para a Disneylândia, empregada doméstica indo para Disneylândia, uma festa danada."

Em novembro de 2019, em entrevista à Folha de S.Paulo, o ministro criticou pobres por não pouparem. Ao defender mudanças radicais na Previdência Social, Guedes afirmou: "Um menino, desde cedo, sabe que ele é um ser de responsabilidade quando tem de poupar. Os ricos capitalizam seus recursos, os pobres consomem tudo". Na realidade paralela do doutor, isso deve acontecer porque os pobres são gastões irresponsáveis. Nesta, contudo, eles mal ganham para sobreviver, que dirá juntar algum cascalho.

Autores

  • Alyce Cardoso Campos Universidade Federal de Lavras, Brasil https://orcid.org/0000-0001-6903-9542
  • Daniel Carvalho de Rezende Universidade Federal de Lavras, Brasil https://orcid.org/0000-0003-1277-724X
  • Ananda Silveira Bacelar Universidade Federal de Lavras, Brasil https://orcid.org/0000-0003-4554-0548
  • Mônica Carvalho Alves Cappelle Universidade Federal de Lavras, Brasil https://orcid.org/0000-0002-0095-3405

DOI:

https://doi.org/10.29149/mtr.v6i2.6558

Palavras-chave:

Classes sociais, Base da pirâmide, Comportamento do consumidor, Trickle down

Resumo

O poder de compra dos indivíduos de baixa renda pode ser considerado significativo para o mercado quando levado em consideração o volume de brasileiros que ocupa a base da pirâmide. Ademais, considera-se que estes indivíduos encontram meios de consumir produtos que eles desejam, geralmente marcadores de status dos indivíduos de alta posição. Neste estudo, o produto que exemplifica esse consumo dos indivíduos de baixa renda para elevação do status e aceitação na sociedade é o iPhone. Desse modo, objetiva-se compreender a relação entre a marca iPhone e a identidade de classe alta e como ele é utilizado como meio de inserção em grupos pelos indivíduos da base da pirâmide. Para tanto, foram realizadas 24 entrevistas com roteiro semiestruturado, contando com o apoio da técnica projetiva da terceira pessoa. A análise dos dados foi a partir da análise de conteúdo de Bardin. Como resultado da pesquisa, é percebido que os indivíduos acreditam que estão se distinguindo de pessoas mais pobres e indo em direção ao mundo dos que possuem maior poder aquisitivo já que são usuários de iPhone como esses indivíduos. Além disso, os entrevistados apontam que o iPhone é um bem que colabora para a aceitação em grupos, sendo este bem uma das melhores formas de minimizar o sofrimento com questões sociais. Com isso, vários sacrifícios são tolerados para que seja possível possuir o smartphone da Apple, como vender ou trocar bens, retirar parte do dinheiro que seria reservado para alimentação, moradia e segurança, além de parcelar em muitas prestações. Mesmo com todas as renúncias necessárias, os benefícios que o iPhone traz para as pessoas de baixa renda é algo que permanece em primeiro plano.

Biografia do Autor

Alyce Cardoso Campos, Universidade Federal de Lavras, Brasil

Doutoranda em Administração pela Universidade Federal de Lavras (UFLA).

Daniel Carvalho de Rezende, Universidade Federal de Lavras, Brasil

Doutor em Ciências Sociais em Desenvolvimento, Agricultura e Sociedade pela UFRRJ. Professor do Departamento de Administração e Economia da Universidade Federal de Lavras (UFLA).

Ananda Silveira Bacelar, Universidade Federal de Lavras, Brasil

Mestranda em Administração pela Universidade Federal de Lavras (UFLA).

Mônica Carvalho Alves Cappelle, Universidade Federal de Lavras, Brasil

Doutora em Administração pela Universidade Federal de Minas Gerais (UFMG). Professora do Departamento de Administração e Economia da Universidade Federal de Lavras (UFLA). 

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Onde estão e quais são as pessoas que consomem o Iphone?

Como Citar

Cardoso Campos, A., Carvalho de Rezende, D., Silveira Bacelar, A., & Carvalho Alves Cappelle, M. (2021). Consumo de iPhone e identidade de classe: um estudo com indivíduos de baixa renda. Marketing & Tourism Review, 6(2). https://doi.org/10.29149/mtr.v6i2.6558

Licença

Copyright (c) 2021 Alyce Cardoso Campos, Daniel Carvalho de Rezende, Ananda Silveira Bacelar, Mônica Carvalho Alves Cappelle

Onde estão e quais são as pessoas que consomem o Iphone?

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Onde estão e quais são as pessoas que consomem o celular?

O uso de smartphones se tornou tão universal que o topo do ranking dos países com mais usuários desses celulares coincide com a lista dos países mais populosos do mundo. China, Índia, Estados Unidos e Indonésia ocupam os quatro primeiros lugares, nessa ordem, nos dois rankings.

Quais são as pessoas que consomem o smartphone?

Isso é refletido também no uso da internet em geral. Smartphones são usados por 71% dos negros e 65% dos brancos, enquanto o uso de computadores de mesa e notebooks é maior entre brancos.

Quais países estão envolvidos no processo do smartphone?

Classificação de 2015.

Quais países e continentes estão envolvidos nos processos de produção comercialização Comsumo e descarte de um smartphone?

Países e continentes que estão envolvidos no processo de produção e comercialização de um smartphone são principalmente China e Taiwan, que localizam-se na Ásia, e são responsáveis por aproximadamente 90% da produção mundial..
Apple..
Motorola..
Xiaomi..