Introdução: A pandemia
provocada pela infecção pelo vírus SARS-COV-2 originário na cidade Wuhan, na China, infectou um pouco mais de 28 milhões de pessoas, causando mais de 900 mil óbitos, até a presente data. A América Latina foi atingida pela pandemia no final de fevereiro, incluindo as comunidades indígenas rurais da região, onde residem aproximadamente 42 milhões de indivíduos. Cerca de 80% dessa população se concentra em áreas da Bolívia, Guatemala, México e Peru, encontrando-se em situação de vulnerabilidade
social. Os serviços de saúde oferecidos para esses grupos étnicos apresentam desafios particulares haja vista os altos níveis de marginalização e diferenças culturais que esse grupo apresenta em relação ao restante da população. Durante as grandes pandemias relatadas na história, os Povos Indígenas tiveram as taxas de infecção mais altas e sintomas mais graves e morte do que a população em geral, devido os determinantes sociais e culturais da saúde e da falta de poder político. No
México, a taxa de mortalidade já atinge 10%, número bem superior a países como os Estados Unidos, Brasil e Rússia. Objetivos: Analisar os desafios enfrentados pelas populações indígenas residente na região do México frente à pandemia pelo coronavírus (SARS-COV-2) por meio de uma revisão sistemática da literatura. Métodos: Foi realizada uma busca bibliográfica no Portal eletrônico PubMed com o uso dos descritores “Covid-19” AND “Indigenous health”. Os critérios de seleção
incluíram revisões de literatura, estudos in vivo, editoriais e relatos de casos. Os critérios de exclusão incluíram, capítulos de livros, estudos in vitro e estudos com animais. Após a aplicação dos critérios de elegibilidade, os trabalhos publicados em 2020 foram selecionados para leitura dos resultados. Resultados/discussão: Segundo os trabalhos avaliados, os principais desafios encontrados pela população indígena residentes no México frente à pandemia estão relacionadas com a desconfiança
nas autoridades de saúde e o acesso às instalações de saúde que se encontram geograficamente distantes dessa população, a descrença na existência e gravidade da pandemia e suas consequências, a veracidade das informações divulgadas sobre as origens da infecção por COVID-19, o acesso limitado à água potável que, consequentemente, implica no não cumprimento das medidas preventivas básicas. Somado a todos os fatores elencados, a falta de proteção financeira e de responsividade da saúde com uma
perspectiva intercultural prejudica a eficácia do tratamento e acompanhamento dessa população. Conclusões: A marginalização, segregação e discriminação dessas tribos estão afetando negativamente sua saúde e bem-estar durante a situação do COVID-19, deve-se, portanto, os sistemas de saúde conter a disseminação do vírus nas comunidades rurais. Apesar da marginalização dos Povos Indígenas frente a COVID-19, as comunidades indígenas estão instituindo suas próprias medidas para gerenciar não apenas a
disseminação do COVID-19, mas também para atender às necessidades decorrentes da pobreza, habitação e a insegurança alimentar insegurança diante da relação à extensão iminente da pandemia a todas as comunidades do México e da América Latina. MARTÍNEZ, Lorena Díaz de León et al. Critical review of social, environmental and health risk factors in the Mexican indigenous population and their capacity to respond to the COVID-19. Science of the Total
Environment, Mexico, v. 733, ed. 1, p. 1-7, 2020. NAVARRO, Sergio Meneses et al. The challenges facing indigenous communities in Latin America as they confront the COVID-19 pandemic. International Journal for Equity in Health, Mexico, v. 19, ed. 63, p. 1-3, 2020. Como CitarAiala de Sousa Lopes, L. ., Rodrigues Thomes, C., Geaquinto, G., Pimentel Sanglard, T., & Magnelli Mangiavacchi, B. (2022). DESAFIOS ENFRENTADOS PELOS INDÍGENAS RESIDENTES NO MÉXICO FRENTE À PANDEMIA PELO CORONAVÍRUS. I SIMPÓSIO DO GRUPO DE ESTUDOS E PESQUISAS EM SAÚDE INDÍGENA DA UEMS, 1(1). Recuperado de https://anaisonline.uems.br/index.php/gepsi/article/view/8008 ResumoA Política Nacional de Atenção à Saúde dos Povos Indígenas (PNASI) foi instituída pelo Ministério da Saúde reestruturando a Atenção Básica à Saúde Indígena, seguindo os princípios e diretrizes do Sistema Único de Saúde (SUS). Este estudo visa identificar as dificuldades enfrentadas pelos indígenas durante o período de permanência na Casa de Saúde Indígena (Casai) em Santarém (PA), na região amazônica. Trata-se de um estudo qualitativo exploratório, cuja abordagem ocorreu por meio de entrevistas semiestruturadas, gravadas e transcritas com 15 indígenas de cinco etnias, assistidas pela Casai (Mawayana, Tunayana, Wai-wai, Tiriyó e Katwena), com auxílio de um tradutor que dominava os dialetos. Utilizamos a análise de conteúdo emergindo em categorias temáticas: as dificuldades enfrentadas durante o período de adaptação na Casai/Santarém, o sentimento em deixar a terra indígena e as perspectivas quanto às melhorias no período de permanência. Consideramos que, apesar das crescentes mudanças e avanços na saúde indígena no Brasil, necessita-se de melhorias que possam atender de fato às peculiaridades de saúde próprias de cada etnia. Palavras-chave: AbstractThe National Policy of Health Care to the Indigenous Peoples (PNASI) was established by the Ministry of Health restructuring the Primary Care to Indigenous Health, following the principles and guidelines from the Unified Health System (SUS). This study aims to identify the difficulties faced by the indigenous peoples during the stay in the Indigenous Health Center (Casai) in Santarém (PA), in the Amazon region. It is an exploratory qualitative study, whose approach was through semi-structured interviews, recorded and transcribed, with 15 indigenous people from five ethnic groups, assisted by the Casai (Mawayana, Tunayana, Wai-wai, Tiriyó and Katwena), with help from a translator acquainted with the dialects. We used the content analysis arising from thematic categories: the difficulties faced during the adaptation period in the Casai/Santarém, the feeling about leaving the indigenous land and the perspectives regarding the improvements during the stay. We consider that, despite the increasing changes and advances in indigenous health in Brazil, improvements that can truly meet the health peculiarities of each ethnic group are necessary. Keywords: IntroduçãoA Política Nacional de Atenção à Saúde dos Povos Indígenas (PNASI) foi instituída pelo Ministério da Saúde por meio da Portaria nº 254, de 31 de janeiro de 2002, reestruturando a Atenção Básica à Saúde Indígena, tendo como objetivo assegurar o acesso à atenção integral à saúde, seguindo os princípios e
diretrizes do Sistema Único de Saúde (SUS), estando em conformidade com a diversidade social, cultural, geográfica, histórica e política, propiciando a superação de fatores que tornam as populações indígenas mais vulneráveis a agravos em saúde de maior prevalência na população em geral, buscando o reconhecimento da medicina tradicional como direito dos povos indígenas à sua cultura (Brasil, 2002aBRASIL. Fundação Nacional de Saúde. Política Nacional de Atenção à
Saúde dos Povos Indígenas. 2. ed. Brasília, DF: Ministério da Saúde: Fundação Nacional de Saúde, 2002a. Disponível em: <Disponível em: http://bvsms.saude.gov.br/bvs/publicacoes/politica_saude_indigena.pdf >. Acesso em: 24 out. 2016. Com a criação dessa política específica, a população indígena deve ser assistida de forma integral e hierarquizada dentro dos princípios que regem o SUS, tendo acessibilidade aos serviços de saúde, desde a atenção primária até o nível de assistência terciária. De acordo com o Ministério da Saúde (Brasil, 2012BRASIL. Ministério da Saúde. Secretaria Especial de Saúde Indígena (Sesai). Conheça a secretaria - SESAI. 2012. Disponível em: <Disponível em: http://portalsaude.saude.gov.br/index.php/conheca-a-secretaria-sesai >. Acesso em:
25 nov. 2015. De acordo com a PNASI, essas Casas de Saúde devem estar em condições de receber, alojar e alimentar os pacientes e acompanhantes encaminhados, prestar assistência de enfermagem em período integral, marcar consultas, exames complementares ou internação hospitalar e
deverão ainda ser adequadas para promover atividades de educação em saúde, produção artesanal, lazer e demais atividades para os pacientes e acompanhantes (Brasil, 2002aBRASIL. Fundação Nacional de Saúde. Política Nacional de Atenção à Saúde dos Povos Indígenas. 2. ed. Brasília, DF: Ministério da Saúde: Fundação Nacional de Saúde, 2002a. Disponível em: <Disponível em: http://bvsms.saude.gov.br/bvs/publicacoes/politica_saude_indigena.pdf >. Acesso em: 24
out. 2016. De acordo com Popyguá (2007POPYGUÁ, T. V. Cultura é aquilo que a gente cultua. In: BRASIL. Ministério da Cultura. Prêmio Culturas Indígenas. São Paulo: Sesc, 2007. p. 13-14. Disponível em: <Disponível em:
https://pt.scribd.com/document/106378185/Catalogo-Premio-Culturas-Indigenas-2006-Edicao-Angelo-Creta >. Acesso em: 21 abr. 2015. Conforme o censo realizado pelo IBGE,1 1 Disponível em: <http://indigenas.ibge.gov.br/>. Accessed on: 7 Dec. 2016. foram registradas 817.963 pessoas autodeclaradas indígenas, estando presentes nas cinco regiões do Brasil, sendo que a região Norte é a que concentra o maior número de indivíduos, 342,8 mil, e o menor, no Sul, 78,8 mil. Estão organizadas em etnias e línguas distintas, dentre elas as etnias que são assistidas na Casai Santarém (PA), foco deste estudo. São as: Tiriyó, Wai-wai, Tunayana, Hiskaryana, Mawayana, Katwena, Xerew, Karyjana, Kayana, Kaxuyana, Zoé, Munduruku e Kayapó. O Ministério da Saúde (Brasil,
2002aBRASIL. Fundação Nacional de Saúde. Política Nacional de Atenção à Saúde dos Povos Indígenas. 2. ed. Brasília, DF: Ministério da Saúde: Fundação Nacional de Saúde, 2002a. Disponível em: <Disponível em: http://bvsms.saude.gov.br/bvs/publicacoes/politica_saude_indigena.pdf >. Acesso em: 24 out. 2016. Na carta dos Mundurukus enviada ao governo brasileiro em 8 de junho de 2013 (CIMI, 2013CIMI - CONSELHO INDIGENISTA MISSIONÁRIO. Carta dos Mundurukus ao governo brasileiro explicita conhecimentos milenares
e reafirma demandas. Brasília, DF, 2013. Disponível em: <Disponível em: http://bit.ly/2ghKuQj >. Acesso em: 24 out. 2016.
Considerando esse aspecto dos laços familiares, evidenciados na carta, torna-se necessário pensar sobre a inclusão da família como suporte necessário e eficaz no processo saúde-doença do cuidar em saúde indígena. Não menos importante, acena-se para a ambiência e as relações interpessoais para o processo de recuperação da saúde do indivíduo como um todo, evidenciando-se por caracterizar os povos indígenas pelas peculiaridades de cada etnia. Diante do contexto, tivemos a seguinte indagação: quais as dificuldades enfrentadas pelos indígenas durante o período de permanência na Casai/Santarém? Esta abordagem justifica-se por proporcionar o relato das dificuldades enfrentadas pelos indígenas, com a perspectiva de oferecer informações aos gestores para minimizar os impactos relacionados com o deslocamento dos indígenas do seu ambiente natural, para ocupar outro ambiente diverso daquele cotidiano, auxiliando, assim, no planejamento de estratégias de ação que minimizem os impactos nos deslocamentos das aldeias e a permanência na unidade de referência. A PNASI do Brasil conferiu o suporte teórico para a pesquisa. ObjetivoO estudo tem como objetivo identificar as dificuldades enfrentadas pelos indígenas durante o período de permanência na Casai/Santarém (PA). MétodoEsta pesquisa é caracterizada como qualitativa, exploratória e descritiva, pois conforme Bicudo (2011BICUDO, M. A. V. Pesquisa qualitativa segundo a visão fenomenológica. São Paulo: Cortez, 2011.), permite compreender as características dos fenômenos investigados. Procedendo dessa maneira, sustenta raciocínios articulados importantes para a tomada de decisão política, educacional e de pesquisa científica. Tais pesquisas examinam a compreensão subjetiva das pessoas a respeito de sua vida diária (Pope; Mays, 2009POPE, C.; MAYS, N. (Org.). Pesquisa qualitativa na atenção à saúde. 3. ed. Porto Alegre: Artmed, 2009.). O modelo assistencial de atenção aos povos indígenas do Brasil tem como base os DSEIs, formados por meio de projetos elaborados com as comunidades, sob a supervisão dos Núcleos
Interinstitucionais de saúde Indígenas (Nisi) e outros profissionais especializados em saúde indígena. Sendo assim, os DSEIs devem ser caracterizados em: base territorial definida por critérios etnogeográficos, epidemiológicos, acesso a serviços (saúde, transporte, comunicação, administrativo e econômico). Ressaltando que as Casais são elementos indissociáveis do DSEI e/ou gerência regional, sendo ligadas aos seus conselhos e/ou ao Nisi (Brasil, 1993BRASIL.
Ministério da Saúde. Segunda Conferência Nacional de Saúde para os povos indígenas: relatório final. 1993. Disponível em: <Disponível em: http://conselho.saude.gov.br/comissao/pgconfparaosindigenas.htm >. Acesso em: 25 nov. 2015. Conforme Oliveira e Rosa (2014OLIVEIRA, R. N. C.; ROSA, L.
C. S. Saúde indígena em tempos de barbárie: política pública, cenários e perspectivas. Revista de Políticas Públicas, São Luís, v. 18, n. 2, p. 481-496, 2014. Disponível em: <Disponível em: http://bit.ly/2ggnu0q >. Acesso em: 14 maio 2016. O local de estudo foi a Casai/Santarém, pertencente ao Distrito Sanitário Indígena Guamá - Tocantins (DSEI Guatoc). O polo-base Santarém-Pará presta assistência em saúde a etnias demandadas das reservas indígenas Nhamundá/Mapuera e Cuminapanema e ainda às etnias munduruku e kayapó, situadas na área de abrangência do polo-base Itaituba - Pará, pertencentes ao Distrito Sanitário Rio Tapajós. A equipe de trabalho da Casai/Santarém é composta pelos seguintes membros: um diretor, quatro enfermeiros, cinco técnicos de enfermagem, quatro agentes administrativos, três cozinheiras, dois motoristas e um intérprete. Os sujeitos de pesquisa foram convidados a participar de forma voluntária, confirmada por meio da assinatura do Termo de Consentimento Livre e Esclarecido (TCLE) redigido em língua portuguesa e traduzido no dialeto indígena de cada etnia, para facilitar a compreensão e evitar qualquer tipo de manipulação tendenciosa para aquisição do aceite em participar do estudo. Após o aceite, a coleta de dados ocorreu no mês de setembro de 2014 por meio de entrevistas realizadas diretamente com os participantes, utilizando um roteiro com as questões norteadoras redigido em português. Com intuito de diminuir a barreira linguística, tivemos o auxílio de um tradutor indicado pela Casai na abordagem daqueles indígenas que não compreendessem a língua portuguesa. Resguardando a identidade dos participantes da pesquisa, foram utilizados os nomes populares de peixes típicos da região: pirarucu, tucunaré, tambaqui, pescada, filhote, lambari, pirapitinga, mapará, dourada, curimatã, caratinga, acarí, surubim, matrichã e aruanã, preservando a confidencialidade das informações. As entrevistas foram gravadas e transcritas para o português com o apoio do tradutor da língua nativa. Foram entrevistados 15 indígenas adultos por qualquer que fosse seu diagnóstico e/ou motivo da permanência na Casai/Santarém. O número de sujeitos da pesquisa foi determinado pela riqueza do conteúdo coletado. O formulário de entrevistas semiestruturado foi dividido em dois momentos, sendo o primeiro composto por perguntas fechadas: idade, sexo, ocupação dentro da comunidade indígena (atividades de trabalho), período de permanência na Casai/Santarém até o período de retorno para a terra indígena e o motivo do deslocamento da Atenção Básica (ou da aldeia procedente) para Atenção de Média e Alta Complexidade (Casai/Santarém). O segundo momento foi composto por perguntas abertas, organizadas de acordo com os objetivos propostos pela pesquisa:
Atendendo à resolução 466/2012 do Conselho Nacional de Saúde, no que se refere aos princípios éticos, foi necessário o parecer favorável do Comitê Nacional de Ética em Pesquisa (Conep), Protocolo nº 827.490 de setembro de 2014 e do Comitê de Ética em Pesquisa da Universidade do Estado do Pará, Protocolo nº 751.016 de agosto de 2014, além da autorização da Coordenação da Casai/Santarém. Para a análise dos dados empíricos, utilizamos a análise do conteúdo de acordo com Minayo (2014MINAYO, M. C. S. O desafio do conhecimento: pesquisa qualitativa em saúde. 14. ed. São Paulo: Hucitec, 2014.). Realizamos leituras exaustivas das entrevistas, deixando-nos impregnar pelo conteúdo, considerando os objetivos e os referenciais teóricos, identificando os temas centrais e aspectos relevantes. Baseados nos objetivos do estudo, no material empírico coletado e no referencial teórico proposto, destacamos três categorias temáticas: Categoria 1 - as dificuldades enfrentadas durante o período de permanência na Casai/Santarém; Categoria 2 - O sentimento em deixar a terra indígena; e Categoria 3 - as perspectivas quanto às melhorias no período de permanência na Casai. Resultados e discussãoNesta pesquisa, foram entrevistados quinze indígenas, sendo oito do sexo feminino (55%) e sete do sexo masculino (45%). Quanto à idade, três tinham de 18 a 28 anos, seis, de 29 a 39 anos, um, de 40 a 49 anos, e cinco, de 50 a 60 anos. As principais ocupações dos sujeitos nas aldeias de procedência são: pescador, professor, artesões, agricultor, agente indígena de saúde (AIS) e merendeira. Os entrevistados pertencem às seguintes etnias: dez Wai-wai, um Mawayana, um Tiriyó, dois Katwena e um Tunayna. Os motivos da vinda desses índios das aldeias e acolhidos na Casai/Santarém foram: referências especializadas aos serviços de média e alta complexidade, exames especializados, procedimentos hospitalares e retorno para acompanhamento/tratamento. O período de permanência dos entrevistados na Casai variou de no mínimo 3 dias e, no máximo, 170 dias. Categoria 1 - As dificuldades enfrentadas durante o período de permanência na CASAI Santarém - Pará / BrasilAs principais dificuldades relatadas pelos indígenas durante o período de permanência foram: marcar consultas; longa espera por procedimentos hospitalares; dificuldade financeira para comprar medicamentos; alimentação diferente das tradicionais indígenas; barreira linguística; estrutura física da Casai, como expressadas nas opiniões a seguir:
Como se observa na fala dos índios, apesar da cobertura assistencial do SUS desde a Atenção Primária até a Atenção Terciária, e, ainda, especificamente com o Sasi, continuam as dificuldades no acesso integral à saúde conforme preconizado pela Lei nº 8.080, de 19 de setembro de 1990. Persiste a situação na qual os usuários não encontram espaço para o encaminhamento de suas demandas em momentos de dor e sofrimento agudo (Azevedo; Costa, 2010AZEVEDO, A. L. M.; COSTA, A. M. A estreita porta de entrada do Sistema Único de Saúde (SUS): uma avaliação do acesso na estratégia de saúde da família. Interface - Comunicação, Saúde, Educação, Botucatu, v. 14, n. 35, p. 797-810, 2010.). Em um estudo realizado por Marinelli et al. (2012MARINELLI, N. P. et al. Assistência à população indígena: dificuldades
encontradas por enfermeiros. Revista Univap, São José dos Campos, v. 18, n. 32, p. 52-65, 2012. Disponível em: <Disponível em: http://revista.univap.br/index.php/revistaunivap/article/view/93 >. Acesso em: 6 maio 2014. Pode-se ressaltar que essas dificuldades enfrentadas por enfermeiros também podem ser enfrentadas pelos indígenas, pois, ao se deslocarem de suas aldeias referenciados às Casais, passam por um período de adaptação. Nesse período, a cultura indígena, com seus hábitos e valores, pode ser vista como uma barreira para adaptação e relacionamento entre os indígenas e os profissionais de saúde (Teixeira, 2008TEIXEIRA, C. C. Fundação Nacional de Saúde: A política brasileira de saúde indígena vista através de um museu. Etnográfica, Lisboa, v. 12, n. 2, p. 323-351, 2008.). Em levantamento sobre a situação dos indígenas nos estados brasileiros realizado pelo Conass
(2014CONASS - CONSELHO NACIONAL DE SECRETÁRIOS DE SAÚDE. A integração da saúde indígena no SUS: uma proposta da gestão estadual. Brasília, DF, 2014. Disponível em: <Disponível em: http://bit.ly/2g2KH6e >. Acesso em: 24 out. 2016. De acordo com Pontes, Garnelo e Rego (2014PONTES, A. L. de M.; GARNELO, L.; REGO, S. Reflexões sobre questões morais na relação de indígenas com os serviços de saúde. Revista Bioética, Brasília, DF, v. 22, n. 2, p. 337-346, 2014.), a internação em hospitais ou permanência na Casai gera, também, a ruptura de regras dietéticas, bastante restritivas que alguns grupos indígenas mantêm, conforme observado nos discursos que se seguem:
Entre outros aspectos, os hábitos alimentares dos indígenas também se diferem dos não indígenas. Aqueles têm um elo de respeito e equilíbrio com a natureza, pois reconhecem que dela provém seu alimento, ervas medicinais, até os instrumentos utilizados para caçar. Contudo, conforme Geniole, Kodjaoglanian e Vieira (2011GENIOLE, L. A. I.; KODJAOGLANIAN, V. L.; VIEIRA, C. C. A. (Org.). A saúde da família indígena. Campo Grande: UFMS, 2011.) destacam, a identidade cultural é elaborada constantemente, através de um processo dinâmico de mudança. De acordo com o Manual de atuação na saúde indígena (Brasil, 2008BRASIL. Ministério Público Federal. Manual de atuação: saúde indígena: grupo de trabalho saúde indígena. Brasília,
DF: 6ª CCR/MPF, 2008. Disponível em: <Disponível em: http://bit.ly/2fovFI6 >. Acesso em: 3 nov. 2016. As mudanças interferem significativamente na saúde dos indígenas, principalmente nas doenças relacionadas às mudanças na alimentação, sendo introduzidos alimentos industrializados, além da diminuição de atividade física, resultando em doenças crônicas degenerativas e demais comorbidades (Gugelmin; Santos, 2006GUGELMIN, S. A.; SANTOS, R. V. Uso do índice de massa corporal na avaliação do estado nutricional de adultos indígenas Xavante, Terra Indígena Sangradouro - Volta Grande, Mato Grosso, Brasil. Cadernos de Saúde Pública, Rio de Janeiro, v. 22, n. 9, p. 1865-1872, 2006.). Sobre o dialeto, observa-se que a barreira linguística se torna um obstáculo para a compreensão fidedigna do que o paciente refere sobre sua saúde, por mais que haja tradutor. Em seu estudo, Pereira (2012PEREIRA, P. P. G. Limites, traduções e afetos: profissionais de saúde em contextos
indígenas. Mana, Rio de Janeiro, v. 18, n. 3, p. 511-538, 2012. Disponível em: <Disponível em: http://www.scielo.br/scielo.php?script=sci_arttext&pid=S0104-93132012000300004 >. Acesso em: 20 abr. 2014.
No que se refere à infraestrutura, seguem os relatos:
Nesses relatos, é possível observar que os indígenas não estão satisfeitos com a ambiência da Casai, assim como também a representação de que é necessário melhorar a estrutura física para melhor acomodação desses usuários. Categoria 2 - O sentimento em deixar a terra indígenaOs sentimentos mais relatados foram: preocupação com familiares, tristeza pelo distanciamento da aldeia e a saudade do convívio familiar, como se observa nos seguintes relatos:
Como se percebe, a família tem um papel fundamental na recuperação e manutenção da saúde, pois os laços afetivos, segundo Borges e Franco (2012BORGES, V. O.; FRANCO, A. L. e S. Família no Programa de Saúde da Família: uma inquietação em sua abordagem. Saúde Coletiva, São Paulo, v. 9, n. 55, p. 19-23, 2012.), promovem melhores resultados na recuperação do indivíduo. De acordo com Becker et al. (2009BECKER, S. G. et al. Dialogando sobre o processo saúde/doença com a antropologia: entrevista com Esther Jean Langdon. Revista Brasileira de Enfermagem, Brasília, DF, v. 62, n. 2, p. 323-326, 2009.), os processos de saúde e doença precisam ser examinados dentro de seus contextos históricos, sociais e culturais. Mesmo com os avanços da medicina, não se pode interferir nos aspectos étnicos e culturais, desvalorizando os saberes e práticas locais. Os locais fora da aldeia deveriam ser
readequados com características que não se distanciem tanto dos costumes locais. Dessa forma, a medicina ocidental e a indígena deveriam estar articuladas para que os objetivos sejam alcançados com segurança e bem-estar tanto do paciente como da família durante a fase de tratamento (Lorenzo, 2011LORENZO, C. F. G. Desafios para uma bioética clínica interétnica: reflexões a partir da política nacional de saúde indígena. Revista Bioética, Brasília, DF, v. 19, n.
2, p. 329-342, 2011. Disponível em: <Disponível em: http://bit.ly/2g4pCZY >. Acesso em: 20 abr. 2014. Categoria 3 - Perspectivas quanto às melhorias no período de permanência na Casai/Santarém
É notório o conflito intercultural, já que esse processo de mudança na rotina interfere, significativamente, no processo saúde-doença, tornando-os mais vulneráveis aos agravos à saúde. Sendo assim, Nascimento et al. (2011NASCIMENTO, F. F. et al. Cuidado à saúde da comunidade indígena Tremembé: olhar dos profissionais de saúde. Saúde Coletiva, São Paulo, v. 8, n. 51, p. 138-143, 2011.) destacam a necessidade de compreenderem o contexto em que esse usuário está inserido, valorizando sua cultura e sua crença, para que o cuidado em saúde se estabeleça plenamente. Pontes, Garnelo e Rego (2014PONTES, A. L. de M.; GARNELO, L.; REGO, S. Reflexões sobre questões morais na relação de indígenas com os serviços de saúde. Revista Bioética, Brasília, DF, v. 22, n. 2, p. 337-346, 2014.) destacam que a incompreensão dessas diferenças culturais, por parte de profissionais de saúde e gestores, pode ser expressa, por exemplo, na inadequação cultural quando da organização de serviços oferecidos na Casai, tais como: a mistura de pessoas de diferentes etnias, entendida como uma situação de risco à saúde, bem como a desconsideração das dietas e restrições alimentares tradicionais das famílias enfermas. Aspectos relacionados à infraestrutura e ambiência também são citados:
Outras perspectivas de melhorias referem-se ao agendamento das consultas, exames e à aquisição dos medicamentos necessários ao tratamento:
Aparece nesses discursos a insatisfação dos indígenas com as condições físicas da Casai para sua acomodação e a de seus acompanhantes, compreendendo assim que a ambiência representa papel fundamental na inclusão terapêutica dessa população. Fato também observado no estudo realizado por Pontes, Garnelo e Rego (2014PONTES, A. L. de M.; GARNELO, L.; REGO, S. Reflexões sobre questões morais na relação de indígenas com os serviços de saúde. Revista Bioética, Brasília, DF, v. 22, n. 2, p. 337-346, 2014.), em que as condições da Casai eram inadequadas para hospedagem de pacientes e familiares, o que representa não ser uma realidade exclusiva da Casai/Santarém, mas de outras Casais no Brasil, necessitando, dessa forma, um olhar diferenciado para essa temática. Considerações finaisEste estudo possibilitou a identificação das dificuldades enfrentadas pelos indígenas durante o período de permanência na Casai e proporcionou discussões com as coordenações locais, sendo apresentados os resultados em reunião, visando readequações em alguns pontos citados pelos indígenas, de acordo com a realidade de cada etnia. Esses achados promoverão, talvez em médio e em longo prazo, discussões a respeito da política de saúde indígena nos diversos níveis, assim como novas abordagens para melhorar o atendimento dessa clientela durante sua permanência fora das aldeias. As principais dificuldades relatadas na Casai/Santarém foram: marcação de consultas, longa espera por procedimentos hospitalares (consultas, exames e cirurgias); dificuldade financeira em comprar medicamentos ou realizar consultas e exames particulares; alimentação diferenciada em relação à tradicional; barreira linguística e cultural; de adaptação em relação à estrutura física da Casai e a convivência com diferentes etnias; impacto da mudança ambiental na rotina. Essas dificuldades não foram comparadas entre as etnias, pois notou-se que tais dificuldades eram sentidas por todas que participaram da pesquisa, assim como também pela desproporção do número de participantes de cada etnia, não podendo ser estendida para as outras etnias não participantes nesta pesquisa. Assim, sugerimos a realização de outros estudos com o mesmo enfoque que ampliem e promovam debates sobre essa temática. Sobre as perspectivas de melhorias, sugeriram o que poderia ser modificado na Casai: a estrutura física, preservar a privacidade de cada etnia em quartos separados; apoio financeiro para comprar a medicação; agilidade na marcação de consultas, encaminhamentos às referências; e alimentação de acordo com o hábito alimentar dos indígenas. Contudo, apesar das crescentes mudanças e avanços da saúde indígena no Brasil, há a necessidade de melhorias que possam atender de fato às peculiaridades de saúde das etnias. Outro fator a considerar é a estrutura física da Casai/Santarém, que diverge da preconizada pela Política Nacional de Saúde Indígena. Reforçamos a importância de que a tomada de decisão seja compartilhada com os indígenas, principalmente sobre as disposições orçamentárias e de gestão desses serviços, cumprindo o direito ao controle social e participativo dos povos indígenas, para melhorar a assistência e a prevenção dos agravos. Referências
Quais são os desafios enfrentados pelos indígenas?Os principais problemas que as comunidades indígenas enfrentam hoje são a consequência daqueles que surgiram há anos. Nos dias atuais há problemas como a miséria, o alcoolismo, o suicídio, a violência interpessoal, que afetam consideravelmente essa população.
Quais os maiores desafios enfrentados pelos povos indígenas ao longo da história?Historicamente, quanto maior é a convivência com os brancos, maior o risco de se perder as tradições. No atual contexto, a preservação do território e da cultura constituem os principais desafios dos povos indígenas.
Quais as principais ameaças e desafios dos povos indígenas nos dias de hoje?Desde o início da pandemia, os povos indígenas estão se organizando para se proteger não apenas da covid-19, mas também de invasores que exploram ilegalmente suas terras em atividades econômicas ilegais como o garimpo e espalham o vírus em seus territórios.
Quais os maiores desafios enfrentados pelos povos e comunidades tradicionais?Proteção. Exploração Indígena. Recursos Naturais. Sobrevivência étnico-cultural.
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