O que é uma lei excepcional?

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A lei penal excepcional ou temporária, conforme o Código Penal Brasileiro, é aquela em que, embora decorrido o período de sua duração ou cessadas as circunstâncias que a determinaram, aplica-se ao fato praticado durante sua vigência. Ou seja, um crime praticado durante sua vigência será julgado conforme seu texto e não conforme as leis correntes.[1]

Consideram-se:

  • leis temporárias: aquelas que possuem vigência previamente fixada pelo legislador;
  • leis excepcionais: aquelas que vigem durante situações de emergência.

Essas espécies de lei têm ultra-atividade, ou seja, aplicam-se ao fato cometido sob o seu império, mesmo depois de revogadas pelo decurso do tempo ou pela superação do estado excepcional.

No direito penal, existe o chamado princípio da irretroatividade da lei, salvo para beneficiar o réu. Isso significa que, se alguém comete um crime que tem uma pena X e lei posterior torna a pena para esse crime mais branda ou descriminaliza o fato, o réu será julgado pela lei posterior. Da mesma forma, se ele comete um fato que lei posterior vem a tornar crime mais grave, será julgado pela lei antiga, de forma que terá sempre o benefício da lei que lhe é mais favorável.

A lei temporária é a exceção a essa regra, pois, se assim não fosse, não teria a eficácia esperada, já que nesse caso os agentes saberiam que seriam beneficiados de qualquer forma pelo fim de sua vigência.

Exemplo: É criada uma lei temporária que define como crime fumar cigarro por 30 dias. Passam-se os 30 dias e a vigência dessa lei termina. As pessoas que fumaram no tempo da vigência da lei responderão pelo crime.

Referências

  1. Lei Penal no Tempo

23 de Dezembro de 2013

Os tipos penais da Lei Geral da Copa e sua duvidosa legitimidade

Está em vigência, desde junho de 2012, a Lei 12.663, mais conhecida como a “Lei Geral da Copa”. Em suas disposições, encontram-se alguns tipos penais cuja vigência termina em 31 de dezembro de 2014. Após o último dia de 2014 esses tipos penais deixam de ter vigência e as condutas ali descritas voltam a ser atípicas ou a adequar-se a outros tipos penais. Os arts. 30 a 33, portanto, são tipos penais temporários ou autorrevogáveis.

Cabe analisar a constitucionalidade de tais tipos penais e, por consequência, a legitimidade para sua aplicação durante e após sua vigência. A questão a ser proposta é confirmar se a previsão de lei penal temporária, prevista no art. 3.o do Código Penal, teria sido recepcionada pela Constituição Federal e, com efeito, se os tipos penais da Lei Geral da Copa são legítimos.

A lei penal temporária constitui exceção à regra da lei sem prazo de validade. Por questões de segurança jurídica, e com o intuito de reforçar o princípio da legalidade, a lei penal entra em vigência sem prazo certo para sua revogação. Deve-se respeitar a estabilidade do sistema jurídico com a revogação de uma lei penal somente por outra lei, seja de forma tácita, seja expressamente. A lei temporária, se fosse a regra, levantaria dúvidas a respeito dos limites da licitude de comportamentos humanos e geraria instabilidade jurídica pela enorme flexibilidade e mutação do poder punitivo estatal.

O art. 3.o do Código Penal prevê a lei penal excepcional e a lei penal temporária. Lei excepcional é aquela que visa atender a situações anormais da vida social (Fragoso, 2006, p. 126), enquanto a lei temporária aparece no sistema jurídico-penal já com a data do término de sua vigência previamente agendada (Busato, 2013, p. 129). Conforme as definições doutrinárias, entende-se aqui que a lei penal temporária deve ser excepcional e a lei excepcional só pode ser temporária. Ou seja, os conceitos complementam-se e a distinção não se faz necessária. Ao afirmar-se que uma lei penal é temporária, necessariamente deve ser, também, excepcional, e vice-versa.

O principal efeito da lei penal temporária ou excepcional é a possibilidade de manter a ultratividade após sua vigência, mesmo que implique tratamento mais gravoso ao agente. No Direito Penal, a regra é a retroatividade da lei penal mais benigna, cujos efeitos podem ser a abolitio criminis, que constitui causa de extinção da punibilidade pela desconsideração do fato como crime em momento posterior à sua prática. Pela regra consagrada ao longo da história, a lei posterior que deixa de considerar um fato criminoso deve retroagir e beneficiar aquele que responde pela conduta até então ilícita. A lei posterior, assim, aumenta o grau de liberdade de agir conforme o direito.

No caso da lei penal temporária ou excepcional, a previsão legal autoriza sua ultratividade após cessar sua vigência, o que, nas palavras de Bitencourt (2013, p. 191), constitui a “exceção da exceção” à retroatividade da lei penal mais benéfica. A doutrina majoritária reconhece a legitimidade da lei penal temporária ou excepcional e sua ultratividade após a vigência. Souza e Japiassu sustentam que “esse grupo de leis regula situações que, na sucessão de leis penais no tempo, não correspondem a uma evolução social a respeito da concepção ilícita do fato” (2011, p. 93). Para essa corrente, o grau de reprovabilidade da conduta em momento certo e determinado não pode ser desprezado, mesmo quando a situação anormal estiver finalizada, ou seja, a desconsideração posterior da periculosidade do comportamento não pode retroagir para o período de anormalidade. Além disso, aceitar a retroatividade da revogação da lei temporária ou excepcional levaria à impunidade do agente que deveria apenas aguardar a cessação de sua vigência para obter os efeitos benignos, apesar da gravidade pontual de seu comportamento. Quer dizer, aceitar a retroatividade, nesses casos, tornaria a lei temporária ineficaz para atingir o objetivo pretendido pelo legislador, qual seja, tutelar bens jurídicos específicos de forma especial, em situações de gravidade anormal.

Em divergência à doutrina majoritária, adota-se aqui o entendimento pela ilegitimidade da lei penal temporária ou excepcional. A Constituição Federal é clara ao afirmar que “a lei penal não retroagirá, salvo para beneficiar o réu” (art. 5.o, XL). O texto constitucional não faz menção a qual lei deverá retroagir para beneficiar o réu: se é apenas lei posterior que venha a modificar lei anterior ou se podem ser incluídas, também, as leis com prazo de vigência e que deixam de ter efeitos após sua autorrevogação. O dispositivo constitucional deve ser interpretado de forma ampla, pois a lei penal envolve restrição da liberdade individual e a estigmatização do acusado. Toda norma que diz respeito a liberdades individuais requer interpretação mais favorável à pessoa humana, desse modo, qualquer vedação a direitos fundamentais deve ter expressa previsão constitucional. Portanto, ao afirmar que a lei penal deve retroagir para beneficiar o réu, a lei temporária perde seus efeitos no plano infraconstitucional. A criação de leis penais temporárias deve ser muito criteriosa, a começar pela necessidade de sua previsão na Constituição Federal.

Especificamente em relação à Lei Geral da Copa, há outros problemas que merecem atenção. Mesmo que se aceite a legitimidade da lei temporária, o conteúdo dos respectivos tipos penais foge à essência de sua excepcionalidade. As leis penais temporárias, para quem as aceita, requer uma situação de anormalidade, de grande crise. O fundamento de se aceitar uma estrutura normativa frágil como as leis temporárias ou excepcionais são situações de anormalidade social ou emergência, ou melhor, uma situação transitória de emergência (Regis Prado, 2004, p. 190).

Na atenta leitura dos tipos penais previstos na Lei Geral da Copa, percebe-se que o objeto de tutela nada mais é que um evento esportivo (de grandes proporções, isso é claro) e sua entidade organizadora.  São crimes: “reproduzir, imitar, falsificar ou modificar indevidamente quaisquer Símbolos Oficiais de titularidade da FIFA”, “importar, exportar, vender, distribuir, oferecer ou expor à venda, ocultar ou manter em estoque Símbolos Oficiais ou produtos resultantes da reprodução, imitação, falsificação ou modificação não autorizadas de Símbolos Oficiais para fins comerciais ou de publicidade”, “divulgar marcas, produtos ou serviços, com o fim de alcançar vantagem econômica ou publicitária, por meio de associação direta ou indireta com os Eventos ou Símbolos Oficiais, sem autorização da FIFA ou de pessoa por ela indicada, induzindo terceiros a acreditar que tais marcas, produtos ou serviços são aprovados, autorizados ou endossados pela FIFA” e “expor marcas, negócios, estabelecimentos, produtos, serviços ou praticar atividade promocional, não autorizados pela FIFA ou por pessoa por ela indicada, atraindo de qualquer forma a atenção pública nos locais da ocorrência dos Eventos, com o fim de obter vantagem econômica ou publicitária”.

Não há qualquer referência a interesse público ou a situação de anormalidade previstas em lei. Apenas se quer tutelar o interesse da entidade responsável pela Copa do Mundo, afirmação reforçada pela previsão de que a ação penal é publicada condicionada à representação da FIFA (art. 34). E, como complemento, a própria lei, no art. 2.o, descreve a FIFA como “associação suíça de direito privado, entidade mundial que regula o esporte de futebol de associação”.

A interpretação sistemática da lei confirma que seus tipos penais carecem de legitimidade porque são temporários e sua vigência não decorre de situação de anormal gravidade.

Não há como sustentar os tipos penais da Lei Geral da Copa. A começar pela própria estrutura típica, a lei penal temporária ou excepcional apresenta duvidosa constitucionalidade porque não está prevista na Carta Magna e por representar flexibilidade exagerada da segurança jurídica. Além disso, a distinção entre lei temporária e lei excepcional não tem utilidade, pois são conceitos que se complementam. Finalmente, mesmo que se reconheça a legitimidade da lei penal temporária, no caso da Lei Geral da Copa, ausentes o interesse público e a situação emergencial temporária. Os tipos penais ali previstos desvirtuam a função do Direito Penal de tutelar os bens mais importantes da sociedade, e não o patrimônio de uma entidade particular, em evidente violação ao princípio da ultima ratio.

Referências bibliográficas

Bitencourt, Cezar Roberto. Tratado de direito penal, parte geral. São Paulo: Saraiva, 2013.

Busato, Paulo Cesar. Direito penal, parte geral. São Paulo: Atlas, 2013.

Fragoso, Heleno Cláudio. Lições de direito penal, parte geral. Rio de Janeiro: Forense, 2006.

Regis Prado, Luiz. Curso de direito penal brasileiro, v. 1. São Paulo: RT, 2004.

Souza, Artur de Brito Gueiros; JAPIASSU, Carlos Eduardo Adriano. Curso de direito penal, v. 1. Rio de Janeiro: Elsevier Campus, 2011.

João Paulo Orsini Martinelli
Pós-doutor em Direitos Humanos (Universidade de Coimbra).
Mestre e Doutor em Direito Penal (USP).
Professor adjunto da Universidade Federal Fluminense (UFF)

O que são as leis excepcionais?

São leis editadas para reger fatos ocorridos em períodos anormais. Ex.: guerra, epidemia, inundações, etc. São leis auto-revogáveis, pois perdem a eficácia pela cessação das situações que as ensejaram.

Qual a diferença de lei temporária e lei excepcional?

Lei excepcional é aquela que visa atender a situações anormais da vida social (Fragoso, 2006, p. 126), enquanto a lei temporária aparece no sistema jurídico-penal já com a data do término de sua vigência previamente agendada (Busato, 2013, p. 129).

O que são a lei temporária e a lei excepcional é porque possuem ultratividade?

Ultratividade (ultrativas) – é o fenômeno de que os fatos cometidos dentro de sua vigência, mesmo após a extinção, continuam a ter efeitos. Pelo fenômeno da ultratividade, os fatos praticados dentro do período da lei excepcional ou temporária (mesmo que já extintas) continuam a produzir efeitos.

O que significa lei temporária?

São leis que contam com período certo de duração. São leis auto-revogáveis, pois possuem data certa para perder a vigência.