Qual foi o primeiro presidente civil do Brasil eleito por meio de voto em 1894?

Prudente de Moraes é visto por historiadores como um homem honesto, mas também articulador e estrategista. Realizou trabalhos de propaganda política para o Partido Republicano por quase vinte anos. Uma de suas estratégias era garantir o apoio de veículos de mídia, como o paulistano “A Província de São Paulo”.

“A imprensa ajudava na sustentação do ideário republicano e, por meio desse trabalho, eram ressaltados os principais temas de discussão, colocando os candidatos do partido em evidência, ao destacar suas ideias e sua atuação”, afirma a historiadora Renata Gava, diretora do Museu Prudente de Moraes.

Jardim do Museu Prudente de Moraes em Piracicaba — Foto: Bolly Vieira/Arquivo pessoal

Outra estratégia importante e também inovadora foi o que hoje é chamado de corpo-a-corpo. “Com uma formação de base política regional forte e atuante, Prudente utilizava mecanismos como cartas e panfletos, além de defender a doutrina republicana em comícios e conferências e percorrer as cidades da região de Piracicaba para conseguir o maior número possível de votos para o partido”, conta Renata.

Família em Piracicaba

Atualmente, vivem em Piracicaba duas bisnetas de Prudente. Uma delas, a professora aposentada Jandyra Silveira Ramos, de 85 anos, se orgulha ao falar do caráter do bisavô.

“Nossa família tem como grande responsabilidade fazer jus à honestidade, à dignidade e ao caráter do Prudente, características que eram conhecidas por todos. Meus pais sempre falavam dessas qualidades e dos seus valores.”

Jabuticabeiras plantadas no Museu Prudente de Moraes em Piracicaba — Foto: Rafael Bitencourt

40 jabuticabeiras

Prudente de Moraes era apaixonada por jabuticabas. Ele plantou no quintal da casa onde viveu em Piracicaba, mesmo imóvel que abriga o Museu Histórico e Pedagógico Prudente de Moraes, cerca de 40 jabuticabeiras, que possuíam um sistema de drenagem em que cada árvore tinha seu cano de água. Não permitia que nenhuma criança entrasse nesse espaço sem a companhia de um adulto e só autorizava a colheita quando os frutos estivessem maduros.

Uma vez um de seus filhos, Antonio, que na época tinha entre seis e sete anos, saltou a cerca que protegia as árvores e foi repreendido pelo pai. Antonio então correu para a casa de um amigo e só retornou para sua residência à noite.

“Após o menino deitar na cama e fingir que estava dormindo, Prudente entrou em seu quarto, arrumou as cobertas, passou a mão em sua cabeça e saiu. E no dia seguinte, continuou tratando o filho como se nada tivesse acontecido”, afirma Renata.

Atualmente, há no Museu Prudente de Moraes duas jabuticabeiras, em homenagem ao seu gosto pelos frutos e à história envolvendo o seu filho.

Àrvore genealógica da família de Prudente de Moraes — Foto: Leandro Alves/Museu Prudente de Moraes

Rigidez com gastos

Prudente de Moraes era muito rígido com a questão econômica e tinha o hábito de anotar todos os gastos que tinha em um pequeno caderno. “Ele anotava desde um simples café tomado enquanto esperava o trem chegar até certas quantias de dinheiro que emprestava a terceiros”, diz a diretora do museu. A rigidez financeira se estendia às roupas.

“Tinha o hábito de usar sempre um casaco e cartola pretos e calça escura. Mandava consertar, quando preciso, as poucas peças do vestuário. Remendava as próprias meias e pregava os botões do casaco e da calça, quando necessário.”

De acordo com Renata, muitos dos biógrafos de Prudente de Moraes relacionam o fato dele ter vivido uma vida simples na infância com o cuidado excessivo que tinha com os gastos. “Ele foi educado assim e, ao longo de toda sua vida, jamais se afastou dos hábitos de poupar adquiridos na infância”, completa.

Museu Prudente de Moraes — Foto: Bolly Vieira

Biografia

Entre os anos de 1865 e 1868 foi vereador e presidente da Câmara Municipal de Piracicaba. Foi deputado provincial nos mandatos de 1868 a 1869, 1878 a 1879, 1882 a 1883 e 1888 a 1889. Foi deputado geral de 1885 a 1886.

Após a Proclamação da República, foi indicado pelo então Presidente do Brasil, Marechal Deodoro da Fonseca, ao cargo de Governador do Estado de São Paulo, cargo que exerceu entre 1889 até 1891, quando renunciou para assumir seus trabalhos no Senado.

Neste cargo o feito mais marcante foi presidir a sessão para Promulgação da Constituição Republicana, em 1891. Eleito pelo povo, foi o primeiro presidente civil do Brasil entre os anos de 1894 a 1898. Vítima de tuberculose, faleceu em Piracicaba no dia 3 de dezembro de 1902.

O estabelecimento do regime republicano no Brasil foi justificado pelas tensões empreendidas pela centralização política do governo monárquico. Dessa maneira, a República prometia conduzir o Brasil às indispensáveis mudanças que tirariam a nação do atraso promovido pelo conservadorismo.

No entanto, o próprio processo de implementação do governo republicano não foi conduzido por uma notória mobilização popular. Munidos por tropas e armas, representantes de instituições militares criaram o novo governo. Responsáveis por dar as condições necessárias para a criação de instituições liberais e democráticas, os militares não cumpriram os ideais por eles mesmos defendidos.

O texto da nova constituição, redigido em 1890, por exemplo, privilegiou a eleição indireta do primeiro presidente do país. Dessa forma, o novo regime retardou a implantação de práticas democráticas dentro do país. Além disso, a adoção do voto não-secreto foi outro instrumento de manipulação política da nova República do Brasil.

Somente em 1894, seis anos após a criação da República, houve a eleição do primeiro presidente eleito pelo voto direto. Representante das oligarquias cafeeiras de São Paulo, nosso primeiro presidente, Prudente de Morais, era favorável ao “projeto republicano positivista”, defensor da tese de que a República privilegiaria a modernização do país defendendo medidas vinculadas à consolidação de uma burguesia nacional.

O que em tese representava o desenvolvimento nacional, na prática serviu para dar margem à instalação das elites agrárias nas estruturas do poder político da nação. Dessa forma, a primeira eleição presidencial esteve longe de aniquilar os problemas da miséria e exclusão social no Brasil. De fato, a República inaugurou o auge de ações políticas corruptas e favoráveis a uma pequena parcela da população.

Não é por acaso que o governo de Prudente de Morais foi palco do episódio de Canudos e do surgimento do cangaço. Assim, devemos ter clara a noção de que a república não inaugura a efetivação de instituições de representação popular preocupadas em defender os princípios da democracia.

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Por Rainer Gonçalves Sousa

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