Como os povos indígenas utilizam os conhecimentos astronômicos no seu cotidiano de 04 exemplos?

Anais da 55� Reuni�o Anual da SBPC - Recife, Julho/2003

Simp�sio CONTRIBUI��ES NATIVAS PARA O CONHECIMENTO

CONTRIBUI��ES DA ASTRONOMIA IND�GENA BRASILEIRA PARA O CONHECIMENTO

Departamento de F�sica/UFPR

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O objetivo desta pesquisa � mostrar como a Astronomia emp�rica dos �ndios brasileiros pode contribuir para o conhecimento formal, principalmente associando a observa��o do c�u com o clima, a fauna e a flora de cada regi�o.

A observa��o do c�u esteve na base do conhecimento de todas as sociedades antigas, pois elas foram profundamente influenciadas pela confiante precis�o do desdobramento c�clico de certos fen�menos celestes, tais como o dia-noite, as fases da Lua e as esta��es do ano. O �ndio brasileiro tamb�m percebeu que as atividades de pesca, ca�a, coleta e lavoura obedecem a flutua��es sazonais. Assim, ele procurou entender essas flutua��es c�clicas e utilizou-as, principalmente, para a sua subsist�ncia.

A Astronomia envolvia todos os aspectos da cultura dos �ndios brasileiros. O car�ter pr�tico dos seus conhecimentos astron�micos emp�ricos podia ser reconhecido na organiza��o social e nas condutas do cotidiano, servindo, por exemplo, para planejar seus rituais, para definir c�digos morais, para ordenar as atividades anuais que eram correlacionadas com os ciclos da fauna e flora do lugar, bem como para planejar a �poca de suas planta��es e colheitas. Eles avaliavam as horas do dia tendo como referencial o Sol e as da noite, a Lua e as constela��es, com precis�o suficiente para regularem suas viagens e seu cotidiano.

Freq�entemente, tendemos a julgar a cosmologia de outras civiliza��es atrav�s de nossos pr�prios conhecimentos, desenvolvidos predominantemente dentro de um sistema educacional ocidental. Esse conhecimento � formal porque tende a ser suportado por documentos escritos, regras, regulamentos e infraestrutura tecnol�gica.No entanto, a vis�o ind�gena do Universo deve ser considerada no contexto dos seus valores culturais e conhecimentos ambientais. Esse conhecimento local se refere �s praticas e representa��es que s�o mantidas e desenvolvidas por povos com longo tempo de intera��o com o meio natural. O conjunto de entendimentos, interpreta��es e significados faz parte de uma complexidade cultural que envolve linguagem, sistemas de nomes e classifica��o, maneiras de usar recursos naturais, rituais, espiritualidade e maneira de ver o mundo.

� evidente que nem todas as culturas atribuem igual significado a um mesmo fen�meno astron�mico, considerando-se que cada tribo possui sua pr�pria estrat�gia de sobreviv�ncia, que se reflete na adequa��o entre as atividades de subsist�ncia e o ciclo das esta��es, por exemplo. Al�m disso, tendo em vista que todas as tribos n�o dependem de suas moradias, da ca�a, da pesca ou dos trabalhos agr�colas da mesma maneira, as constela��es sazonais, por exemplo, podem ter um significado e uma utilidade diferente para cada uma delas. Devemos separar, tamb�m, a maneira de ver o Universo dos �ndios que vivem no litoral daqueles que vivem no interior, bem como considerar a localiza��o geogr�fica de onde s�o feitas as observa��es. Por exemplo, perto da Linha do Equador n�o tem muito sentido falarmos em esta��es do ano em fun��o da temperatura do local, pois al�m dela variar pouco, a maior e a menor temperaturas nem sempre correspondem aos dias pr�ximos do que chamamos de ver�o e de inverno, respectivamente. O clima dessa regi�o � caracterizado, principalmente, por uma esta��o seca e uma esta��o chuvosa.

O conhecimento ind�gena, n�o-formal - em contraste com o conhecimento formal - � transferido oralmente de gera��o a gera��o, atrav�s de mitos, m�sicas e ora��es, sendo raramente documentado.

Em 1612, o mission�rio capuchinho franc�s Claude d�Abbeville passou quatro meses com os Tupinamb� do Maranh�o. No seu livro �Hist�ria da Miss�o dos Padres Capuchinhos na Ilha do Maranh�o e Terras Circunvizinhas�, publicado em Paris, em 1614, considerado uma das mais importantes fontes da etnografia dos Tupi, ele registrou o nome de cerca de 30 de estrelas e constela��es conhecidos pelos �ndios da ilha.Infelizmente, ele identificou apenas algumas delas. Um dos motivos que nos incentivou a realizar este trabalho foi verificar que o sistema astron�mico dos extintos Tupinamb� do Maranh�o, descrito por d�Abbeville, � muito semelhante ao utilizado, atualmente, pelos Guarani do Sul do Brasil, embora separados pelas l�nguas (Tupi e Guarani), pelo espa�o (mais de 2.500 km, em linha reta) e pelo tempo (quase 400 anos).

Durante a pesquisa, utilizamos documentos hist�ricos que relatam a import�ncia da astronomia no cotidiano da fam�lia ind�gena e, tamb�m, diversos mitos com conota��o astron�mica. Al�m disso, realizamos entrevistas e observa��es do c�u com paj�s das cinco regi�es brasileiras.

A literatura sobre os �ndios brasileiros que ainda n�o tinham muito contato com o homem branco, mesmo sendo escrita por pesquisadores cujos objetivos n�o eram focalizados no campo da Astronomia, demonstra que esse povo possu�a um vasto e significativo conhecimento dos astros. Ela lista um n�mero substancial de nomes de estrelas e constela��es, a maioria localizada na Via L�ctea, a faixa esbranqui�ada que atravessa o c�u, onde as estrelas e as nebulosas aparecem em maior quantidade, facilmente vis�vel � noite. Essa faixa � a parte mais densa da nossa gal�xia que tamb�m recebe o nome de Via L�ctea.

A literatura tamb�m relata diversos mitos ind�genas envolvendo conhecimentos astron�micos. A maioria dos mitos associada �s estrelas e constela��es foi criada para ajudar �ndio a identific�-las e serviam como um m�todo mnem�nico para transmitir oralmente o conhecimento do c�u de gera��o a gera��o.

No trabalho de campo, observamos principalmente a utiliza��o do Sol, da Lua e das constela��es no cotidiano dos �ndios brasileiros.

Eles determinam o meio-dia solar, os pontos cardeais e as esta��es do ano utilizando o rel�gio solar que na l�ngua tupi, por exemplo, se chamava Cuaracyraangaba. Ele � constitu�do de uma haste cravada verticalmente no solo da qual se observa a sombra projetada pelo Sol, sobre um terreno horizontal.

Segundo Claude d�Abbeville, os extintos Tupinamb� do Maranh�o, situados perto da Linha do Equador, tamb�m observavam o movimento do nascer e do p�r-do-sol e o seu deslocamento na linha do horizonte, que se efetua entre os dois tr�picos, limites que jamais ultrapassam. Eles sabiam que quando o Sol vinha do lado norte trazia-lhes ventos e brisas e que, ao contr�rio, quando vinha do lado sul, trazia chuvas. Eles contavam perfeitamente os anos em doze meses e isso pelo conhecimento do deslocamento do Sol de um tr�pico a outro e vice-versa. Conheciam igualmente os meses pela �poca das chuvas e pela �poca dos ventos ou, ainda, pelo tempo dos cajus.

Os �ndios acordavam ao nascer-do-sol e quando constru�am sua moradia perto de uma montanha escolhiam a posi��o em que a insola��o fosse mais adequada. Atualmente, levantamos em plena escurid�o, em alguns dias do ano, para irmos � escola ou ao trabalho e constru�mos enormes pr�dios que projetam sombra sobre as constru��es vizinhas. Deixamos de ter o nosso ritmo biol�gico regulado naturalmente pelos movimentos do Sol e isso pode acarretar enormes dist�rbios em nosso rendimento intelectual e em nossa sa�de.

Depois do Sol, a Lua � o astro mais observado pelos �ndios brasileiros. Ela � a principal regente da vida marinha.

Os �ndios brasileiros, em virtude da longa pr�tica de observa��o da Lua, conheciam e utilizavam suas fases, associadas com as esta��es do ano, na pesca e na agricultura. Por exemplo, o camar�o � mais pescado entre fevereiro e abril, na mar� alta de lua-cheia enquanto o linguado � mais pescado no inverno, nas mar�s de quadratura (lua-crescente e lua-minguante). No corte de madeira, determinadas fases da Lua s�o mais favor�veis para que ela se mantenha com boa qualidade.

Verificamos que etnias diferentes de �ndios brasileiros possu�am um conjunto muito semelhante de conhecimentos astron�micos que era utilizado para materializar o calend�rio e a orienta��o. Esse conjunto comum se refere, principalmente, aos movimentos aparentes do Sol, da Lua, de V�nus, do Cruzeiro do Sul, das Pl�iades, de Escorpi�o, das Tr�s Marias e da Via L�ctea. Os �ndios brasileiros davam maior import�ncia �s constela��es localizadas na Via L�ctea, que podiam ser constitu�das de estrelas individuais e de nebulosas, principalmente as escuras.

Com as observa��es do c�u que realizamos com �ndios de todas as regi�es do Brasil permitiram localizar a maioria das constela��esTupinamb�, apenas relatadas por d`Abbeville e de diversas outras fam�lias ind�genas brasileiras.

Para divulgar o conhecimento astron�mico emp�rico dos �ndios brasileiros, constru�mos um planet�rio e um observat�rio tem�ticos no Parque da Ci�ncia do Paran�.

O planet�rio consiste de uma esfera de seis metros de di�metro. Atrav�s de um cilindro de proje��o, vemos as principais constela��es que resgatamos com os �ndios brasileiros. Por exemplo, as quatro constela��es sazonais: a Anta (primavera), o Homem Velho (ver�o), o Veado (outono) e a Ema (inverno).

O observat�rio � constitu�do de uma haste de dois metros de altura feita de madeira, cravada verticalmente sobre um terreno horizontal. Ela funciona como um rel�gio solar (Gn�mon). A haste fica no centro de um c�rculo de rochas de dez metros de di�metro e, a partir dela, h� alinhamentos de rochas orientados para os pontos cardeais e para as dire��es do nascer e do p�r-do-sol nos solst�cios. Durante o dia observamos os movimentos aparentes do Sol e � noite as constela��es ind�genas no c�u real.

Devido o interesse da comunidade em geral neste trabalho, estamos construindo um planet�rio-observat�rio itinerante, para ser utilizado principalmente por professores de escolas ind�genas e do ensino b�sico.

Verificamos que algumas das constela��es dos �ndios brasileiros, utilizadas no cotidiano, s�o as mesmas de outros �ndios da Am�rica do Sul e dos abor�gines australianos.

A Astronomia Ind�gena pode contribuir para o conhecimento formal, principalmente nas seguintes �reas: Educa��o B�sica, Agricultura Org�nica, Pesca Artesanal e Meio -Ambiente.

Os pr�prios �ndios nos auxiliam e ap�iam em nossa pesquisa, pois eles tamb�m est�o preocupados com a preserva��o de sua cultura que corre o risco de desaparecer justamente na �poca em que ela se encontra mais valorizada, pela sua contribui��o para o desenvolvimento sustent�vel e a redu��o da pobreza. A comunidade cient�fica desconhece muito do conhecimento ind�gena que pode se perder em uma ou duas gera��es. Esse risco ocorre pelo r�pido processo de globaliza��o e pelas dificuldades em documentar, avaliar, validar, proteger e disseminar os conhecimentos dos �ndios brasileiros.

Como os indígenas usavam a astronomia?

A astronomia indígena é a mais antiga das ciências. Ela fala da forma como os povos antigos orientavam o próprio cotidiano, construindo calendários a partir do movimento do sol, da lua e das constelações. Esta relação com os astros foi fundamental para o desenvolvimento das sociedades humanas.

Como o que os conhecimentos astronômicos têm sido utilizados pelos povos indígenas?

Os índios brasileiros, em virtude da longa prática de observação da Lua, conheciam e utilizavam suas fases, associadas com as estações do ano, na pesca e na agricultura.

Como a astronomia influência no cotidiano dos povos indígenas?

"Com esse conhecimento, os índios constroem seus calendários, marcando a época dos trabalhos agrícolas, de floração e frutificação, da reprodução dos peixes e outros animais", explica Afonso. O céu também guia o tempo das festas religiosas e dos procedimentos feitos pelos pajés para proteção e cura dos índios da tribo.

Como era a utilização do céu pelos indígenas?

Povos como os Indígenas Guarani e os Aborígenes Australianos já utilizavam as estrelas para projetarem constelações e a associarem à passagem do tempo, épocas de plantio e colheita, períodos de chuvas e estiagem, calor e frio ou mesmo a mal presságios.